Tom Zeller Jr., The New York Times
As advertências eram sérias e foram feitas repetidamente desde 1972: se os sistemas de resfriamento algum dia falhassem no reator nuclear “Mark 1”, a principal estrutura de contenção que envolve o reator provavelmente explodiria quando as varetas de combustível nuclear internas sofressem um superaquecimento. Nesse caso, um nível de radiação perigoso vazaria para o meio ambiente.
Agora, quando uma estrutura de contenção do Mark 1 encontra-se danificada na polêmica usina nuclear Fukushima Daiichi e outras usinas encontram-se sob uma pressão intensa, as deficiências do projeto – desenvolvido na década de sessenta pela General Electric – poderão estar contribuindo para esta catástrofe que está em andamento no Japão.
Quando a capacidade de resfriar um reator fica comprometida, a estrutura de contenção, ou blindagem, é a última linha de defesa. Feita tipicamente de aço, ela é projetada para impedir – por algum tempo – que as varetas radioativas fundidas emitam radiação no meio ambiente caso as tentativas de resfriamento do reator fracassem completamente.
Em alguns reatores, conhecidos como reatores de água pressurizada, o sistema fica selado dentro de um grosso sarcófago de aço e cimento. A maioria dos reatores nucleares do mundo é desse tipo.
Mas o modelo de estrutura de contenção e o sistema supressor de pressão utilizados nos reatores danificados da usina Fukushima Daiichi são fisicamente menos robustos, e há muito se acreditava que esse projeto era mais susceptível a falhas em casos de emergência do que modelos de outras empresas. Nos Estados Unidos, 23 reatores em 16 localidades utilizam o projeto Mark 1, incluindo a usina de Oyster Creek, na região central de Nova Jersey, a de Dresden, próxima a Chicago, e a de Monticello, perto de Minneapolis.
A General Electric começou a fabricar os reatores Mark 1, que funcionam com água em ebulição, na década de sessenta, apresentando-os aos potenciais compradores como projetos baratos e fáceis de serem construídos – em parte porque eles usavam uma estrutura de contenção comparativamente menor e mais barata.
Os reguladores dos Estados Unidos começaram a identificar essas deficiências há muito tempo.
Em 1972, Stephen Hanauer, que à época era funcionário do setor de segurança da Comissão de Energia Atômica, recomendou que a fabricação do sistema Mark 1 fosse suspensa porque ele apresentava riscos inaceitáveis. Entre as preocupações citadas estava a dimensão muito pequena da estrutura de contenção, que era mais susceptível a explosões e rupturas decorrentes de um acúmulo de hidrogênio – algo que pode ter acontecido na usina Fukushima Daiichi. No final daquele mesmo ano, Joseph Hendrie, que mais tarde iria se tornar o diretor da Comissão Reguladora Nuclear, uma agência que substituiu a comissão atômica, afirmou que a ideia de acabar com aqueles sistemas era atraente. Mas, segundo Hendrie, a tecnologia tinha sido tão amplamente aceita pela indústria nuclear e pelas autoridades de regulamentação, que “uma reversão daquela política equivocada, especialmente naquela época, poderia muito bem ter significado o fim da era da energia nuclear”.
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Em um e-mail enviado na terça-feira (15/03), David Lochbaum, diretor do Programa de Segurança Nuclear da organização Union for Concerned Scientists, disse algo que atualmente parece irônico, tendo em vista os efeitos potenciais de dimensões globais do acidente japonês: “Se esses reatores não forem banidos, isso poderá significar o fim da era da energia nuclear”, afirmou Lochbaum, um engenheiro nuclear que passou 17 anos trabalhando em instalações nucleares, incluindo três que utilizavam o projeto da General Electric.
As dúvidas quanto a esse projeto aumentaram em meados da década de oitenta, quando Harold Denton, um funcionário da Comissão Reguladora Nuclear, afirmou que os reatores Mark 1 apresentavam uma probabilidade de 90% de explodir, caso as varetas de combustível sofressem um superaquecimento e se derretessem em um acidente.
Os executivos do setor questionaram essa afirmação, dizendo que a probabilidade de falha desses reatores era de apenas 10%.
Nesta semana, Michael Tetuan, um porta-voz da Divisão de Água e Energia da General Electric, defendeu energicamente esta tecnologia, afirmando que ela “é a coluna dorsal do setor, tendo apresentado um histórico comprovado de segurança e confiabilidade durante mais de 40 anos”.
Tetuan disse que atualmente existem 32 reatores de água em ebulição Mark 1 operando com segurança.
“Nunca houve nenhum problema com o sistema de contenção de um Mark 1”, disse ele.
Várias empresas de energia elétrica e operadoras de usinas atômicas ameaçaram processar a General Electric no final da década de oitenta, após a revelação de documentos internos da companhia, redigidos em 1975, que davam a entender que os projetos da estrutura de contenção não haviam sido suficientemente testados ou continham falhas que poderiam comprometer a segurança.
Os reatores Mark 1 nos Estados Unidos passaram por uma série de modificações desde que surgiram as preocupações iniciais quanto ao projeto. Entre elas, segundo Lochbaum, houve modificações no toro em formato de doughnut, ou rosca – um compartimento cheio de água que reveste a estrutura principal de contenção que é usada para reduzir a pressão no reator. Nas primeiras sequências de operação, o vapor que saía da estrutura principal e entrava no toro sob alta pressão podia fazer com que a estrutura literalmente saltasse no solo.
No final de década de oitenta, todos os reatores Mark 1 dos Estados Unidos foram equipados com sistemas de ventilação para ajudar a reduzir a pressão em uma situação de superaquecimento.
Não se sabe precisamente que modificações foram feitas nos reatores japoneses de água em ebulição que agora estão apresentando falhas, mas James Klapproth, o principal engenheiro nuclear da General Electric Hitachi, diz que um sistema de ventilação foi instalado nas usinas Fukushima para ajudar a aliviar a pressão.
O papel específico desempenhado pelo design da General Electric na crise das usinas Fukushima é provavelmente uma questão a ser debatida pelos especialistas, e é possível que qualquer reator viesse a sucumbir diante do terremoto e do tsunami que atingiram o Japão na semana passada.
Embora a responsabilidade da General Electric pareça ser limitada no Japão – em grande parte porque o sistema regulador naquele país responsabiliza mais a companhia operadora da usina –, as ações da companhia sofreram uma queda de 31 centavos na terça-feira, tendo ficado cotadas em US$ 19,61.
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