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sexta-feira, 19 de março de 2010

Privatizou, piorou!



Nossa vila botocuda está passando por sobressaltos privatistas constantes nos últimos meses. O vírus neoliberal se instalou tardiamente nas profundezas mais recônditas dos cérebros dos lideres municipais que estão a frente da administração publica neste momento, e a moléstia que provocou desandou numa diarréia mental colateral sem precedentes.

Querem privatizar tudo: primeiro os serviços de saúde, depois falam em entregar os serviços de água e saneamento (históricamente conduzidos de maneira adequada e competente pela autarquia municipal SAMAE) e passeiam felizes como Alice por outras searas privatistas.

Para iluminar essa questão, muito oportuno é o artigo do sociologo Léo Lince, que trata dos problemas advindos da privatização de alguns serviços públicos no Rio de Janeiro. Podemos facilmente estabelecer um paralelo com a situação corrente aqui em São Bento do Sul. Nos dá uma idéia o que esperar dessas iniciativas. O artigo fala dos transportes públicos (temos problemas nessa área aqui?) mas por comparativo pode ser entendida para todos os outros serviços públicos a ser privatizados :


A crise do metrô do Rio de Janeiro: privatizou, piorou!


ESCRITO POR LÉO LINCE

Originalmente no ótimo Correio da Cidadania

Purgatório da beleza e do caos, o Rio de Janeiro faz jus ao mote da canção. A cidade, linda e maltratada, vive dias marcados pela vizinhança da catástrofe: o colapso total de seu sistema de transporte urbano de massas. E pior: a luz no fim do túnel, tudo indica, é o "trem" desgovernado e na contramão.

Tal sistema, que grande coisa já não era, atravessa um período de acelerada deterioração. A piora na qualidade dos serviços em todos os segmentos do setor tem sido uma dolorosa constante. Não passa um dia sequer sem o sobressalto de alguma notícia triste. Sinais de alerta do impasse que se aproxima.

No caso dos ônibus, onde circula a maioria dos passageiros, a calamidade é antiga e parece sem remédio. Nunca houve licitação e os donos do pedaço, grandes financiadores de campanha eleitoral, mandam e desmandam. As barcas mal conservadas ficam à deriva nas águas da Guanabara. Filas imensas, desconforto geral. Nos trens da Supervia, o desrespeito ao cidadão chega ao limite das chibatadas e o tumulto diário dos vagões superlotados. Um absurdo sem tamanho.

A crise do Metrô completa o desacerto geral que inferniza a vida dos cariocas. Lamentável, pois o Metrô do Rio, enquanto foi uma empresa pública, prestava serviços de excelente qualidade. Limpo, confortável e seguro. Hoje, privatizado, exibe as tarifas mais caras do Brasil. Sujo, desconfortável e inseguro. Defeitos na refrigeração, vagões superlotados, propaganda em demasia em tudo quanto é fresta, até nas janelas dos vagões, o passageiro nem vê as estações. E, o mais grave, uma série crescente de falhas de segurança.

A situação, que vinha piorando de forma paulatina, experimentou um agravamento súbito com a inauguração da linha Pavuna/Botafogo. Uma linha burra, cruzamento da ganância com a irresponsabilidade. Criou um conjunto de intersecção entre as antigas linhas 1 e 2, gambiarra que encalacrou o funcionamento geral. O intervalo entre as composições saltou da casa dos 4 para a dos 7 minutos, daí as estações entupidas. A diminuição de vagões por composição multiplicou o número de passageiros por metro quadrado, daí os vagões atulhados. A superposição de linhas, controlada por sinalização manual e precária, trouxe a lentidão maior ao conjunto e riscos de colisões.

O erro crasso foi inaugurado com pompa e circunstância. Estavam lá, no palanque do desatino, o presidente Lula, o governador Cabral e o prefeito Paes, os três mosqueteiros da privatização. De lá para cá, a situação só fez piorar. Os técnicos mais competentes já alertaram: o projeto está errado. Defendem a volta do projeto original, com a extensão da linha 2 até a Praça XV, sem o uso de trilhos comuns por linhas diferentes. As estações do Estácio e do Largo da Carioca foram projetadas para possibilitar o cruzamento sem transtornos de tais linhas.

O cidadão, vítima de múltiplas irresponsabilidades, se pergunta: reclamar com quem? A agência reguladora, que tem a obrigação legal de fiscalizar o serviço prestado e proteger os usuários, não faz nada. O governo do estado, poder concedente, também não faz nada. Ao invés de cassar a concessão, o governador, movido não se sabe por que mistérios, cuidou de prorrogá-la por mais 20 anos. Reclamar com os felizes donatários do Consórcio que explora o rentabilíssimo negócio é quase impossível.

Nunca se sabe, no tipo atual de capitalismo, quem são os donos ou controladores de semelhantes arapucas. Diziam que era o Daniel Dantas, mas pode ser a "máfia russa" ou qualquer "persona" do mesmo naipe.

O Ministério Público propôs ação que pede o fim da linha burra e a volta da baldeação no Estácio. O Judiciário, por intermédio de uma vara empresarial, intimou a concessionária a prestar esclarecimentos em relação à superlotação. A operação com a nova linha, que coloca em risco a segurança do usuário, pode ser paralisada. Menos mal, mas é pouco. Que a crise sirva para abrir o olho do cidadão. Os serviços públicos essenciais não podem ser entregues à sanha do lucro privado. A prova está no colapso do sistema de transportes urbanos do Rio de Janeiro: privatizou, piorou.

Léo Lince é sociólogo.

3 comentários:

  1. E o caminho é o quê? Virar uma União Soviética?

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  2. Ñ é disso que se trata Elvis. Até acho que soluções de descentralização na administração publica podem ser alternativas válidas para se tentar resolver problemas crônicos em diversas áreas, mas contanto que se criem mecanismos válidos de controle, o que essas “agencias reguladoras” do FHC já deram mostras de ñ dar conta do recado – ñ regulam nada e só trabalham a soldo das concessionárias enquanto o usuário só se fode.

    Então temos que pensar soluções outras e enquanto isso ñ se resolve. Até lá ficamos contra a privatização, nesse momento e dessa forma!.

    O problema aqui em SBS ainda fica agravado pois que a coisa está sendo feita na surdina sem transparência quase nenhuma e tudo leva a crer que num jogo cartas marcadas, ai a coisa fica ainda mais critica. Os caciques do poder econômico daqui querem impor suas soluções goela abaixo e sempre vem com todas a soluções prontas de acordo com seus interesses. São uns filhotes de tucano mais bem acabados que existe, embora sejam todos herdeiros da UDN e da ARENA.

    Enquanto isso vamos pensando na U.R.S.A.L. (União das Republicas Soviéticas da América Latina)... (rsrsrsrs – ñ vá levar isso a sério, como esses retardados que vivem tendo pesadelos com o Foro de SP)

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  3. Bom, eu tenho uma opinião mais otimista sobre os serviços privatizados, em particular os de telecomunicações.

    Quanto aos problemas dos trens do RIo de Janeiro, isso é coisa de longa data, vem desde a época da RFFSA, tanto assim que até Monteiro Lobato menciona isso num conto dele (vide http://www.tsfr.org/~efbrazil/electro/efcb.html).

    Curiosamente, na minha visão ultra-liberal do mundo, eu faço três exceções à preferência genérica por serviços de empresas privadas: luz, água e transporte em massa de passageiros. Como você citou água e transportes, não posso dizer que minha opinião é antítese da sua.

    Dou as minhas razões. Pessoalmente, acho que estatais num país grande e díspare como o nosso, sempre serão valhacoutos de safados. Não há como não serem objeto de uso político. Talvez funcione em países pequenos e de população homogênena como na Europa, e mesmo lá há diferenças absurdas.

    Só dá pra tolerar estatais quando as possíveis vantagens superam as desvantagens certas supracitadas. Luz e água eu considero duas situações deste gênero, pois são serviços eminentemente técnicos, todo mundo precisa deles, não precisa fazer propaganda. São casos onde a politcagem age a favor da qualidade do serviço e não contra -- imagine a perda de votos para um prefeito ou governador onde cai a luz e não há água.

    Além disso, quem "produz" água não é a CASAN, é a cachoeira do rio. Da mesma forma, a eletricidade é quase toda produzida por empresas que não a CELESC. Elas meramente repassam o "produto", não podem cobrar muito caro por isso porque apesar de essencial muita gente não pode pagar caro po eles, e tais empresas tendem a não virar elefantes brancos.

    No caso dos transportes públicos de passageiros, existe um problema econômico, que impede o mercado de proporcionar um serviço bom e suficiente. As pessoas precisam de transporte coletivo bom, porém não podem pagar pelo custo de capital dele. Assim é em todo lugar do mundo.

    Mesmo nos EUA, existe uma vastíssima infra-estrutura de rodovias bancada pelo governo (no caso das ferrovias, elas arcam com a manutenção da via e até com IPTU do terreno por onde passa o trilho, não admira que as ferrovias quase quebraram todas por lá nos anos 70).

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