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quarta-feira, 24 de março de 2010

Lenha no MST... mas quando a grileiro é a Globo, Cutrale, Hotel Hyatt... ah, ai tudo bem!

desenho: Latuff 2008

“O Estado invadiu meu terreno”


por Joaquim Carvalho, no blog do Morumbi

Normalmente, a imprensa noticia a invasão de áreas por sem terra e sem teto e ao Estado cabe o papel de, cumprindo ordem judicial, retirar os invasores, o que no jargão jurídico se chama fazer “a reintegração de posse”. Mas e quando o invasor é o Estado? Quem vai retirá-lo? Esta é a situação denunciada à Justiça por Manoel Borges Ferreira, um senhor de 66 anos que mora em Guarulhos e tem a escritura de compra do terreno vizinho à TV Globo, na esquina da avenida Jornalista Roberto Marinho (antiga Águas Espraiadas) com a Chucri Zaidan. Além da escritura, o imóvel está registrado no cadastro de IPTU da prefeitura em seu nome. Apesar disso, desde que a Record denunciou que o terreno era ocupado irregularmente pela TV Globo, o Estado colocou lá uma placa para anunciar a construção de uma escola técnica e um contêiner, para servir de guarita para um guarda. Procurado pelo blog, Manoel deu a seguinte entrevista:

Blog – A quem pertence o terreno?
Manoel –
É meu. Tenho escritura. A prefeitura cobra IPTU de mim e minha escritura está registrada no 15º Cartório de Registro de Imóveis. O Estado não tem documentação legal e invadiu a minha área. Antes era a Globo a invasora, agora é o Estado. Estou lutando contra gigantes.

Blog – Como o senhor comprou aquele terreno?

Manoel – Eu trabalho com regularização de documentação imobiliária. Este é o meu negócio. Em 1996, fui contrato para regularizar uma área na Chucri Zaidan. O dono era o Mário Bardelli. Ele havia comprado a área na década de 60, da família de Policarpo Correa, um português da Ilha da Madeira que adquiriu muitas terras onde hoje é o Brooklin. Mário estava sem dinheiro e eu fiz uma permuta com ele. Em troca, dei a ele terrenos meus em Bertioga, no Litoral, que são mais fáceis de vender. Foi tudo registrado, tudo legalizado.

Blog – E por que o senhor não ocupa o terreno?

Manoel – O DER – Departamento de Estradas de Rodagem – foi o primeiro a invadir meu terreno. A empresa é uma estatal e, há muitos anos, ela desapropriou a Telefunken e, de fato, tinha uma grande área ali. Não sei por que, esta área acabou fazendo parte de um terreno que foi vendido a um condomínio. O dono do terreno vendido a esse condomínio era o Pão de Açúcar. O condomínio que comprou o terreno era formado pelo Bank Boston, o Hotel Hyatt e a Rede Globo. Mais tarde, o condomínio foi desmembrado e cada um ficou com a sua parte. O terreno do DER era ali, mas a área foi vendida por outra pessoa. Houve uma sobreposição de áreas, e o DER acabou entrando no meu terreno, dizendo que era dele. Mas não era, nunca foi. Tenho a escritura para provar. O erro está em outro lugar. Mas, em vez de brigar com os grandes, o DER resolveu me prejudicar. Sou a parte mais fraca. Depois, o DER fez uma escritura de cessão de direito à Fazenda do Estado de São Paulo. Eles tentaram vender o terreno em leilão, mas eu entrei na Justiça e o comprador desistiu de ficar com a área. Ele fez o certo, porque o terreno é meu e o Estado não podia transferi-lo a particular. Aí a Globo ficou na área como se fosse dela, tinha até pista de cooper para seus funcionários. Para entrar no terreno, que é meu, eu já tive até que chamar a polícia.

Blog – E qual é a situação hoje?

Manoel – Eu entrei com uma ação anulatória da escritura de cessão de direitos do DER para a Secretaria da Fazenda do Estado. Esta ação está correndo. Esta semana, eu entrei com outra ação, uma proibitória. É para impedir que o Estado construa ali a escola técnica. Se quer fazer a escola, procure outro terreno. Não invada o meu.

Blog – E já houve alguma decisão?
Manoel Estou levantando dinheiro para pagar as custas, que são muito altas. Devo pagar esta semana e então o juiz poderá aprecisar meu pedido de liminar.

Blog – Como o senhor vive?
Manoel Tenho dificuldade. Estou com problemas cardíacos. É uma situação de extrema violência esta que eu vivo. Mas não vou desistir. Minha esperança é que aqueles que erraram sejam punidos e isso inclui o 13º Cartório de Registro de Notas, no Brooklin, que fez uma escritura fraudulenta. O DER não podia fazer uma escritura de cessão de direitos de uma área que não lhe pertence. O cartório aceitou. O terreno do DER é ocupado hoje pela Globo e o hotel Hayatt. Por que não vão brigar com eles?



comentário de Miriam no blog do Nassif

Nassif, olha só o imbróglio do terreno que a Globo “doou” para o Estado, que recebera por cessão do DER [Departamento de Estadual de Estradas de Rodagem], que invadiu a propriedade do Sr. Manoel Borges Ferreira, que luta na justiça e tenta impedir a construção da anunciada escola técnica de multimídia, áudio e vídeo.

Hoje (23.03.2010) foi dada uma liminar parcial ao Estado para conceder o interdito proibitório apenas na área comprovadamente pública:

Processo 053.10.006498-4
Classe Interdito Proibitório (Área: Cível)
Assunto Posse
Distribuição Livre – 04/03/2010 às 11:01
2ª Vara de Fazenda Pública – Foro Central – Fazenda Pública/Acidentes
Local Físico 23/03/2010 06:31 – Aguardando Publicação – IMPR. 100
Reqte Fazenda do Estado de São Paulo – FESP
Advogado JORGE GOMES DA CRUZ

Reqdo Manoel Borges Ferreira

23/03/2010 Concedida em Parte a Medida Liminar no Pedido Inicial

Vistos. 1.Trata-se de pedio liminar de interdito proibitório de área que a autora alega ser pública. 2. Em cognição sumária, estão presentes os requisitos legais para a concessão da medida na forma da fundamentação. Com efeito, o imóvel registrado sob a matrícula n. 109.599, de fato, foi adquirido pelo DER, doado à autora e depois cedido para uso de terceiro. Porém, o réu menciona que a área por ele defendida não está incluída pela matrícula (item 6 fl. 29). E, se de fato, não há descrição adequada de qual é a área pública, ainda que remanescente (fl. 32), caberia, em tese, ação discriminatória, pelo interessado, para se saber exatamente se se trata de área pública ou particular. Por tais fundamentos, DEFIRO parcialmente a liminar para conceder o interdito apenas na área comprovadamente pública, qual seja, aquela constante da matrícula n. 109.599 (fls. 19/23). 3. Cite-se e intime-se. Int.

A íntegra do despacho do Tribunal de Justiça de São Paulo está aqui

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