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sábado, 11 de fevereiro de 2012

Uma analise ponderada a respeito das greves das PMs




por Nivaldo Santana, em seu blog


As singularidades do movimento paredista da PM baiana tem provocado imensa repercussão nacional. Greve nesse setor muito sensível envolve não apenas os servidores e o governo, mas toda a sociedade. Por isso, o tema precisa ser tratado com muita cautela e amplitude, sem simplismos reducionistas.


A mídia e os governos, na maioria das vezes, preferem o caminho fácil da criminalização da luta e da tentativa de indispor os líderes da greve com a população. Um dos valores caros das elites, consagrado na Constituição, é o de que o estado não pode perder o monopólio do uso da violência.


Com a greve, esse "monopólio" fica em xeque. As lideranças do movimento de servidores que usam armas, portadores, portanto, do poder de coerção, devem ter consciência que qualquer passo em falso em suas mobilizações pode provocar muitas reações negativas e prejudicar os objetivos da luta.


Por isso tudo,  greves na polícia não podem ser avaliadas como a de trabalhadores civis comuns. Mobilizações no setor de segurança reclamam procedimentos diferenciados, maior maturidade e capacidade política da direção para conduzir a luta com equilíbrio e não cair nas armadilhas. 


Essas coisas são fáceis de falar e difícil de fazer, mas são premissas importantes para orientar o debate. Trabalhadores que prestam serviços essenciais, não só os policiais, também precisam ter direito de greve, mas esse direito precisa ser exercido nos marcos de uma regulamentação democrática e civilizada. 


Como sindicalista, presidi uma entidade do setor de saneamento básico, que ao lado dos eletricitários compõem o ramo dos urbanitários. Em todo o país, sempre há greves nessa área, mas não se tem notícias de que os grevistas desse segmento tenham interrompido o fornecimento de água ou energia elétrica durante os movimentos paredistas.


Da mesma forma, quando os médicos realizam greves não abandonam seus pacientes na UTI nem deixam de atender todos os casos emergenciais. A justa mobilização dos trabalhadores por seus direitos não pode ferir outros direitos e transformar a população em vítima ou refém de quem exerce função essencial. 


Por analogia, assim deve ser enxergada a mobilização dos funcionários públicos que exercem funções na área de segurança. Policias militares e civis precisam ter o direito de fazer greve por melhores salários e condições de trabalho, assim como os vigilantes, uma categoria civil com funções assemelhadas.


Esse direito, no entanto, tem limites. Por exemplo: não se enquadra nesse direito fazer passeatas ou outras ações com o uso de armas, nem realizar atos ilegais, como depredar patrimônio, queimar ônibus ou dar tiros para o alto para chamar a atenção do movimento.


Provavelmente a grande maioria dos policiais em greve pensa dessa maneira. Atos isolados e criminosos devem ser tratados como tal, sem generalizações para o conjunto do movimento. Mas sempre fica uma pergunta no ar: a greve não "libera" os criminosos para mais ações com a confiançã na impunidade?


De outra parte, os governantes de todos os níveis, principalmente em um país como o Brasil, com altos índices de violência, precisam dar condições salariais e de trabalho dignas para esses servidores, compatíveis com a complexidade, periculosidade e dureza dos seus afazeres.


Uma das origens dessa controvérsia é a PEC 300/2008, que torna o piso salarial dos policiais e bombeiros militares do Distrito Federal como piso nacional. Os estados alegam não tem condições de bancar esse piso e o governo federal não aceita criar um fundo federal para bancar o novo piso proposto.


Esse mosaico de questões em jogo depõe contra posturas rígidas de determinados governadores. A inabilidade ou indisposição para negociar, a retórica virulenta e a tentativa de não reconhecer a legitimidade do pleito dos policiais não contribuem para a superação dos repetidos impasses salariais. 


Ampliando o ângulo de análise dessa greve, pode-se dizer que enquanto a parte do filé dos orçamentos públicos for drenado para o setor financeiro, a União, os estados e os municípios conviverão com o dilema do cobertor curto para atender todas as obrigações do poder público.


Tudo isso coloca no topo da agenda do país a imperíosa necessidade do desenvolvimento econômico e social. O desenvolvimento é condição necessária para dotar o Estado de condições mínimas para cumprir suas tarefas de indutor do crescimento e promotor da justiça social. 

Um comentário:

  1. Como disse o próprio Lula, greve é um instrumento extremo, pra ser usado em casos extremos.

    Mas veja o que acontece: você só vê greve, e MUITA greve, no serviço público, que sempre pagou melhor que a iniciativa privada. Do Lula pra cá, a diferença aumentou mais ainda, nem por isso as greves se foram. Tem categoria que faz greve praticamente todo ano (universidades federais e Receita Federal me vêm à cabeça).

    Quanto ganha um fiscal da Receita, ou um funcionário de UF? Muito dinheiro. Muitíssimo acima do limiar de sobrevivência digna. (Não vou entrar no mérito do merecimento, porque é algo extremamente subjetivo. Merecer bom salário, todo mundo merece, não é?) Só neste ponto já fica óbvia a imoralidade dessas greves sazonais.

    Estas greves prejudicam muita gente, embora de maneira difusa. Aluno fica sem aula e importação de remédio é ameaçada. Aliás, nunca entendi porque, em caso de greve da Receita, as importações não são simplesmente liberadas. Se a briga dos fiscais é com o governo, que penalizem o governo via arrecadação reduzida, e não o resto do país.

    Enfim, esses grupos fazem o país de refém anualmente, mas "está tudo certo". Talvez porque boa parte da classe média, da classe formadora de opinião, esteja trabalhando para o governo ou sonhando em passar no concurso. Minha tese particular. Eu mesmo tenho amigos na Receita e em UF. É mais difícil apedrejar uma classe a que amigos seus pertencem e até onde sei fazem um trabalho digno do salário. Não estou em absoluto imune a este efeito, portanto. A frase ficou Gödeliana.

    Mas aí acontece uma coisa curiosa. Servidores públicos de "linha de frente", os que prestam serviços realmente essenciais, como policiais, professores, controladores de vôo, são justamente os que ganham pouco, percebem salários realmente no limite da sobrevivência e não pertencem à classe média alta.

    Aí, não podem fazer greve, porque com escola fundamental em greve os pais não têm onde estacionar as crianças, perderão as férias de janeiro em Camboriú, ou a segurança fica ameaçada etc.

    Aquela velha desculpa de que policial militar é sujeito à lei militar é um anacronismo risível. Aliás, já passou 15 anos da hora de acabar com isto, e também com essa divisão idiota e cara que é haver duas polícias (civil e militar).

    É como o caso dos controladores de vôo, que não podiam dizer publicamente que o sistema era falho porque podiam ser presos, sem habeas corpus. Precisou-se esperar um avião cair na Amazônia (com duas amigas minhas dentro) para o público "descobrir" isto. (A Veja já tinha feito várias reportagens sobre a má situação do controle de vôo no Brasil, a primeira foi em 1995 ou antes.)

    Mas não, como o cara é militar, tem de se virar de boca fechada com equipamentos obsoletos, 320 aviões piscando na tela e salário de 1500 reais, vivendo em Brasília... Mas aí não pode fazer greve porque prejudicaria as férias de julho em Gramado, as passagens já estão compradas... quem sabe se algum outro avião deixou de cair justamente porque deixou de decolar no "caos aéreo"?

    Mais um prego no caixão do serviço público do Brasil: injusto com o povo a quem deveria servir, e (surpresa!) injusto para com seus próprios integrantes.

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