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quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

A sanha do Capitalismo Verde (2) a fraude usando o mote das mudanças climáticas



Texto postado por mim, Henry, aqui,  em agosto de 2009 (na época que esse blog botocudo ainda não existia).



Enquanto para a maior parte da humanidade a mudança climática significa desastre, algumas brilhantes mentes empresariais a percebem como uma boa oportunidade de negócios. Na forma por eles considerada, a mudança climática diz respeito às emissões de carbono e o carbono pode ser comercializado como uma mercadoria no mercado global. Tal mercado - é o que eles dizem - pode valer bilhões ou inclusive trilhões de dólares e eles esperam que redunde em grandes lucros para si. Não importa se tal mercado não tem qualquer valor em absoluto para deter a mudança climática; apenas conta seu valor como um investimento lucrativo.

O problema é que essas pessoas têm poder e muita influência tanto em nível nacional quanto internacional, onde a legislação e os acordos são feitos sob medida para adaptar-se a seus desejos. Esse foi o caso na Convenção sobre Mudança Climática e seu correspondente Protocolo de Kioto, que cedeu às pressões ao aceitar o mercado de carbono como uma das “soluções” para a mudança climática. Assim o chamado “Mecanismo de Desenvolvimento Limpo” foi aprovado como um meio para “compensar” as emissões de CO2.

Adicionalmente, o apoio governamental às abordagens do “mercado livre” permitiu que os mesmos atores estabelecessem um mercado de carbono voluntário em que as pessoas são ludibriadas ao acreditarem que pagando umas taxas podem ficar livres de culpa por suas emissões de CO2- por exemplo, nas viagens de avião. Assim surgiu o mercado de “carbono- neutro”.

Tanto o mercado de carbono “oficial” quanto o “não oficial” têm incluído as plantações de árvores como um dos possíveis mecanismos para “compensar” as emissões.

O WRM tem produzido abundantes informações sobre os impactos das plantações de árvores em geral, tem desenvolvido análises sobre as razões pelas quais as plantações não deveriam ser consideradas como sumidouros de carbono, tem detalhado as razões para opor-se ao mercado de carbono e tem explicado por que “a neutralidade do carbono” é uma fraude. Todas estas informações estão disponíveis no site.

Agora queremos focalizar uma única questão, que é em si mesma suficiente para as plantações de árvores serem excluídas como sumidouros de carbono: o risco de incêndio.

Imagine a seguinte situação. Uma empresa poluidora no Norte paga a um vendedor de “carbono-neutro” que promete “compensar” suas emissões plantando árvores. Assumamos que as árvores são plantadas de fato e que absorvem todo o volume de carbono emitido pela empresa poluidora. Seis anos mais tarde, a plantação toda incendeia- se. O resultado será que a plantação queimada terá liberado todo o volume de carbono que supostamente devia compensar. Isso significa que a plantação só terá servido para permitir a empresa poluidora evitar investir naquilo que é mais necessário sob uma perspectiva climática: cortar as emissões.

O anterior é o cenário de uma situação real, porque os tipos de plantações mais comuns- eucaliptos e pinheiros- são naturalmente propensos ao incêndio. Os dois tipos de árvores são altamente inflamáveis nas florestas naturais – os incêndios na realidade colaboram para superar a concorrência de outras espécies- e são ainda mais inflamáveis em plantações de rápido crescimento em grande escala porque geram um ambiente muito seco sob suas copas, ideal para o fogo se espalhar.

Adicionalmente, as condições sociais que criam também fazem com que sejam alvos de incêndios provocados em diferentes locais em que os moradores foram afetados. Ainda que não seja um fato provado, dizem que alguns incêndios em lugares tão distantes como Chile e Suazilândia, têm sido iniciados por moradores locais deslocados ou afetados pelas plantações. Há aproximadamente 10 anos, na Venezuela, os empregados das plantações da empresa celulósica Smurfit tinham ordens de registrar todas as pessoas das comunidades locais que passavam próximas às plantações e confiscar fósforos e acendedores por medo de incêndios provocados. E a possibilidade era real porque a maioria dos moradores queria de fato pôr fogo nas plantações e o expressava abertamente.

Tanto por razões sociais quanto ambientais, as plantações constantemente ardem ao redor do mundo. Alguns dos casos que tiveram mais cobertura mediática incluem as plantações- e florestas- na Austrália, Espanha, Portugal, Chile, África do Sul, Suazilândia. Mas basta com fazer uma busca simples na internet para encontrar mais incêndios relacionados com plantações em países com vastas áreas de monoculturas de árvores.

A conclusão óbvia quanto às plantações como sumidouros de carbono é que é muito imprudente- por não dizer diretamente estúpido- usar as plantações para armazenar carbono. As plantações como sumidouros têm um único aspecto positivo: retratam a fraude do mercado de carbono em seu pior aspecto.





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ATUALIZAÇÃO fevereiro 2012

Além do mais, o mercado mundial (ou pelo menos o europeu) de créditos de carbono já se transformou numa putaria total (palavra chula), como atesta este artigo (só em inglês - vou traduzir oportunamente


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ATUALIZAÇÃO 2  - Tradução botocuda para o artigo acima

Surpresa!… As estripulias de um “mercado-livre-que-não-é-tão-livre” agora vão de um escândalo ao seguinte. Num mercado real quando alguém vende alguma coisa real o comprador compra o que desejava desde o inicio e a conversa não pode virar em chorumelas, pelo menos não vai longe. Se alguém lhe vende uma carroça de carvão e depois aparece com ela vazia, você vai perceber na hora.
Mas se alguém lhe vende dois milhões de Certificados de Emissões (de carbono) Reduzidas (CERs) que não valem absolutamente nada, como podem convence-lo a comprar esse lixo?... Ah, são “certificadas”!... São realmente certificadas, e como você engoliu que valem alguma coisa: Bem vindo ao mundo dos títulos fantasmas, em que a confiança não apenas mantém ou pode quebrar um mercado, mas é sua única assinatura.
O jornal londrino The Times  em um artigo intitulado  “Chaos in the carbon market” (link é acessível só para assinantes) aborda o bordel que se tornou esse mercado na Europa. 
O governo húngaro (oh, sujeitos folgados) se saíram com uma de que CERs são garantidos pela ONU (o são pela União Européia) e dessa forma podiam usar esses títulos para abater obrigações de empresas húngaras endividadas e depois revender esses mesmos títulos para que outros pudessem abater suas obrigações de emissão de carbono também. É como revender uma refeição depois que a mesma já foi comida. Interpelado sobre isso o governo húngaro se justificou dizendo que os CERs usados para abater dividas foram revendidos “só” para investidores não-europeus. Está certo!... então agora faz sentido: não-europeus são trouxas que rasgam dinheiro.
Na verdade, como só coisas de livres-mercados soem ser, CERs usados voltam ao mercado de títulos da Europa costumeiramente, como já se noticiou:
As agencias de títulos e valores BlueNext (francesa) e Nord Pool (dos países nordicos) suspenderam as negociações com Certificados de Emissões Reduzidas (CERs) tão logo se soube que em determinadas circunstâncias foram negociadas de forma ilegal.  
O Valor desses títulos caíram de €12 para €1 por tonelada de carbono seqüestrado da noite para o dia. A comissão Européia anunciou imediatamente suspender o resgate e os subsídios sobre as RCEs e UREs (Unités de Réduction des Emissions = Emission Reduction Units  ERUs – titulo da mesma familia).
As coisas ficaram pretas para os frangotes do mercado de carbono. Num primeiro momento os governos emitiram muitas licenças levando ao excesso de oferta e depois ao desastre. O dois mais acreditados auditores que operavam no sistema europeu - DNV Det Norske Veritas (noruegues) e SGS (frances) -  foram flagrados com a mão na cumbuca e um após o outro suspensos por irregularidades.
O policia européia (Europol) descobriu que alguns agentes estavam cobrando taxas em nome de seus governos e depois embolsando o que arrecadavam. 
Mercado nem livre nem consertável:  Algumas almas crédulas ainda imaginam que podem consertar essa situação com mais regulamentação, auditorias e assim fechar a maioria das brechas, mas esse é justamente o problema: num mercado fake baseado em bens não mensuráveis ou verificáveis facilmente, dirigido à empresários do terceiro mundo, o mercado em si é uma “brecha”. O único meio de fechar as brechas é acabar com o mercado.

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