por Herman E. Daly
Objetos criados pelo homem atulham o meio ambiente. Teorias econômicas que funcionavam bem em um mundo vazio já não se adequam a um planeta lotado
É generalizada a convicção de que o crescimento é uma panacéia para todos os grandes males econômicos do mundo moderno.
Pobreza?
Basta fazer a economia crescer (ou seja, incrementar a produção de bens e serviços e estimular os gastos dos consumidores), e a riqueza se propagará de cima para baixo na sociedade. Não deveríamos redistribuir riqueza dos ricos para os pobres, porque isso tornaria o crescimento mais lento. Contra o desemprego é só intensificar a demanda por bens e serviços, baixando os juros e estimulando investimentos.
Excesso de população?
Basta fomentar o crescimento econômico e confiar em que a transição demográfica resultante reduza as taxas de nascimentos.
Degradação ambiental?
Confiemos na curva de Kuznets, uma relação empírica com o propósito de mostrar que, com crescimento incessante do Produto Interno Bruto (PIB), a poluição inicialmente aumenta, mas depois atinge um máximo e declina.
Confiar dessa maneira no crescimento poderia não trazer problemas se a economia mundial existisse em um vácuo, mas as coisas não são assim. A economia é um subsistema da biosfera finita, que lhe dá suporte. Quando a expansão da economia afetar excessivamente o ecossistema circundante, começaremos a sacrificar o capital natural (como peixes, minerais e petróleo) que valem mais do que o capital criado pelo homem (estradas, fábricas e eletrodomésticos). Teremos, então, o que denomino crescimento deseconômico, produzindo "males" mais rapidamente do que bens - tornando-nos mais pobres, e não mais ricos.
Não é fácil reconhecer e evitar o crescimento deseconômico. Um dos problemas é que algumas pessoas beneficiam-se dele e não têm estímulo para mudar. Além disso, as contas nacionais não registram explicitamente os custos de crescimento, por isso não os vemos claramente. A humanidade precisa fazer a transição para uma economia sustentável - que respeite os limites físicos inerentes ao ecossistema mundial e garanta que continue funcionando no futuro. Se não fizermos essa transição, poderemos ser punidos não apenas com crescimento deseconômico, mas com uma catástrofe ecológica que reduziria sensivelmente nosso padrão de vida.
A maioria dos economistas contemporâneos discorda de que alguns países estejam rumando para a deseconomia. Muitos ignoram a questão da sustentabilidade e confiam que, como já fomos tão longe com crescimento, poderemos continuar assim para sempre. A preocupação com a sustentabilidade, porém, tem longa história, remontando a escritos de John Stuart Mill na década de 1840. A abordagem contemporânea baseia-se em estudos realizados nas décadas de 1960 e 1970 por Kenneth Boulding, Ernst Schumacher e Nicholas Georgescu-Roegen. Essa tradição é levada adiante pelos denominados economistas ecológicos, como eu, e em certa medida por subdivisões da corrente econômica principal chamada economia de recursos e ambiental. De modo geral, porém, a corrente principal, os economistas neoclássicos, considera a sustentabilidade um modismo e se alia ao crescimento.
Mas há fatos evidentes e incontestáveis: a biosfera é finita, não cresce, é fechada (com exceção do constante afluxo de energia solar) e obrigada a funcionar de acordo com as leis da termodinâmica. Qualquer subsistema, como a economia, em algum momento deve necessariamente parar de crescer e adaptar-se a um equilíbrio dinâmico, algo semelhante a um estado estacionário. As taxas de nascimentos devem ser iguais às de mortalidade, e as de produção de commodities devem se igualar às de depreciação.
Felicidade.
Uma das forças motrizes do crescimento insustentável tem sido o axioma da insaciabilidade: as pessoas serão sempre mais felizes consumindo mais. Entretanto, pesquisas de economistas experimentais e psicólogos levam à rejeição desse axioma.
Crescentes evidências, como o trabalho de 1990 de Richard A. Easterlin, da Universidade do Sul da Califórnia, sugerem que o crescimento (econômico/material) nem sempre incrementa a felicidade - nem a utilidade ou o bem-estar. Em vez disso, a correlação entre a renda absoluta e a felicidade é válida apenas até um limiar de "suficiência"; além desse ponto, apenas o status relativo influencia a autopercepção de felicidade.
O crescimento não é capaz de incrementar a renda relativa de todos. As pessoas que conseguirem isso em conseqüência de crescimento adicional seriam compensadas por outras cuja renda relativa cairia. Além disso, se a renda de todos aumentasse proporcionalmente, nenhuma renda relativa cresceria, e ninguém se sentiria mais feliz. O crescimento torna-se como uma corrida armamentista em que os dois campos vêem seus ganhos cancelados mutuamente.
Muito provavelmente, os países ricos atingiram o "limite de futilidade", ponto além do qual o crescimento não incrementa a felicidade. Isso não significa que a sociedade de consumo morreu - apenas que o aumento do consumo além do limiar de suficiência, seja ele fomentado por publicidade agressiva ou compulsão inata por compras, simplesmente não está tornando as pessoas mais felizes, em sua própria avaliação.
Um corolário acidental é que a sustentabilidade poderá custar pouco em termos de felicidade para as sociedades que atingiram a suficiência. A "impossibilidade política" de uma economia sustentável pode ser menos impossível do que parecia.
Se não fizermos os ajustes necessários para atingir uma economia sustentável, condenaremos nossos descendentes a uma situação infeliz em 2050. O mundo se tornará cada vez mais poluído e mais despojado de peixes, combustíveis fósseis e de outros recursos naturais. Durante algum tempo, essas perdas poderão continuar a ser mascaradas pela enganosa contabilidade baseada no PIB, que mede o consumo de recursos como se fosse renda. Mas, em determinado momento, o desastre será sentido.
Esse artigo foi escrito em 2005, mas continua totalmente atual, pode ser visto completo na edição on line da ótima Scientific American Brasil, aqui.
E infelizmente isso não vai ter solução, simplesmente vamos pressionar a natureza até que as consequencias custem caro a ponto de frear a atividade econômica e por reflexo reduza-se a pressão sobre os recursos naturais.
ResponderExcluirA muito longo prazo, a diminuição da população vai ajudar um pouco a esfriar a economia, mas a estabilização da população está prevista para apenas 2085, então a coisa vai ficar feia antes.
O pior é que nenhum país pode tomar a iniciativa de "esfriar" sua economia, não sem virar uma ditadura comunista fechada, o que traz seus próprios problemas. O resto do mundo vai continuar do jeito que está, e o prejuízo é em dobro (natural e econômico).
É como o lance da liberação das drogas: todo mundo sabe que é idiota criminalizar o consumo de drogas. Mas nenhum país dá o passo decisivo da descriminação, porque viraria um pária internacional, *mesmo* que 10 anos depois todos copiassem a atitude, e *mesmo* que no fundo todo mundo saiba que a solução é esta.
A triste condição humana...
Dá pra tentar uns paliativos, é claro, em ambos os casos. Dá pra tornar o tráfico um crime punido com 10 cestas básicas, e dá pra dirigir o país de modo a minimizar danos ambientais.
Mas não tenho muitas esperanças nem mesmo quanto a isso. Os formuladores da política ambiental, como IBAMA, não têm os pés no chão, ficam obstando hidrelétricas e usinas nucleares porque dá ibope, enquanto isso a energia elétrica não pode faltar e queima-se carbono... e entram 1000 carros novos por dia no tránsito só em SP, o que corresponde a uma usina de 70MW. Queimando gasolina. (Ok, nem todos os carros ficam ligados o tempo todo, então considere aí 1000 carros por semana.)