em O Globo (quem diria..., neste blog)
artigo do leitor Salvador Correia de Sá e Benevides – engenheiro florestal
Incomoda-me a persistência das acusações que a sociedade vem fazendo, através de seus políticos, empresários e formadores de opinião, contra o licenciamento ambiental e mesmo a toda política ambiental, como de atravancar o progresso do país e de nos submetermos a interesses estrangeiros.
Para inicio de conversa, a política ambiental vai mal sim. Afinal de contas, assim como a educação, a segurança e a saúde, ela é produto da postura da própria sociedade, e são exatamente os acusadores os principais responsáveis por fazer da política ambiental mais um caso "para inglês ver", gente que tem todas as condições para fazer as coisas certas, mas não faz.
A defesa do uso racional dos recursos naturais e humanos e o desejo de preservar a biodiversidade e cenários que nos encantam são velhas demandas brasileiras. A mais ilustre voz foi José Bonifácio, que muitos brasileiros nem sabem quem foi. Ainda hoje, são escassos os meios para se projetar e executar a política ambiental. Resultado disso é, por exemplo, a transferência ao empreendedor do ônus de se estudar a área visada e elaborar relatórios de impacto ambiental, obviamente medíocres e tendenciosos.
O licenciamento ambiental vai mal porque ainda hoje falta conhecimento da realidade ambiental brasileira, faltam pesquisas, divulgação, organização de trabalhos, de dados etc. Vai mal porque falta pessoal capacitado, enquanto sobra improviso e má gestão do recurso humano. Vai mal porque o Estado brasileiro persiste no excesso burocrático como arma inútil contra abusos e para proteger incompetentes com poder de decisão. Vai mal porque os próprios requerentes de licenças trabalham mal, deixam passar prazos, fazem projetos ruins etc. Vai mal porque quem manda nos órgãos públicos são os políticos, representantes de uma sociedade alienada e oportunista, e que estão sempre dispostos a subverter a máquina pública em favor de seus amigos.
O político é, normalmente, o cara que se especializou em explorar demandas de pessoas e empresas, usando disso como escada para o poder. Normalmente, não entende do funcionamento da máquina pública, muito menos da missão do órgão ou setor dado a ele como parte da jogatina do poder, mas sabe pintar de verde o urubu para vendê-lo como papagaio a essa sociedade já definida. Uma vez lá dentro, ele precisa de funcionários interessados em satisfazer sua vontade (e em protegê-lo) em troca de cargos, facilidades e outros privilégios - é assim que, normalmente, nascem os funcionários de carreira, que ascendem justamente por cumprir essa missão, geralmente infame, porque envolve pressões contra funcionários sérios, acobertamento de corrupção e outros desvios, chute nas prioridades reais para favorecer projetos eleitoreiros e, enfim, a transformação do licenciamento em mero exercício burocrático.
Esse malfeitor eleito precisa de uma curriola de funcionários para embasar seus atos. Sem eles, ele não é nada, nada faz. E é no seu gabinete, sigiloso, que ele tratará dos casos específicos, dos requerimentos de licença valiosos, nesta hora entrando às vezes a criação de dificuldades para vender facilidades. E aí está o ápice da perversão: quanto mais sério o julgamento técnico contrário ao projeto, mais alta será a propina cobrada pelo supremo senhor para que este encontre um caminho liberador...
Contra a situação ruim do licenciamento e sem denunciar os motivos e os responsáveis, os acusadores pedem agilização. Chega de burocracia e de radicalismo! O político atende simplesmente dando corda para os radicais se enrolarem (e, se possível, se enforcarem) e pedindo empenho aos carreiristas para que sustentem o atropelamento das leis e da moral públicas. A seriedade vai para o espaço porque, como sempre, não há tempo para ficar-se discutindo falta de pessoal, de pesquisas, de equipamentos etc. A agilização do licenciamento é um termo bonito para esculhambação criminosa.
A Justiça assiste a tudo isso como sempre assistiu a tudo, os meios de comunicação permanecem na sua habitual superficialidade conveniente e os parlamentos continuam como balcão de negócios. E todos, no final das contas, mostram-se muito preocupados com o aquecimento global...
Comentário botocudo:
Concordo na maioria dos pontos com o autor, por isso defendo hoje a municipalização do licenciamento, mesmo que se incorra em certos perigos de também se ficar na dependência de benevolência política à maneira dos probelmas descritos no artigo, ficam mais fáceis de contornar se forem a nível local.
Tem aquele exemplo canônico da falta de visão dos órgãos ambientais: enchem hidrelétricas de empecilho e impedem construam termelétricas perto dos centros de consumo. Porém, todo dia entram 1000 novos automóveis no trânsito de SP, cuja potência combinada é a de uma pequena termelétrica.
ResponderExcluirO cara falou o que todo mundo já sabe: que esses empecilhos são colocados para AUMENTAR O ARREGO e não para efetivamente resolver um problema.