Breve História da Borracha Parte 4
Durante a Primeira Grande Guerra, para cada envolvido no serviço militar a máquina de guerra utilizava 16 quilos de borracha, enquanto na Segunda Guerra Mundial essa quantidade tinha aumentado para 98 quilos, motivo pelo qual estava justificada a qualificação da matéria-prima como "estratégica".
Como vimos as plantações da Malásia haviam caído na mão dos japoneses e os aliados ficaram em situação precária de fornecimento deste insumo fundamental no esforço de guerra. Mas qual a solução?... Recorreu-se novamente ao velho esquema que tinha proporcionado o boom borracheiro: o extrativismo, explorando os seringais amazônicos que ainda estavam em mãos dos seringalistas tradicionais. Havia urgência de borracha para o esforço aliado, mas para efetivar um grande programa de oferta baseado novamente no extrativismo amazônico haveria urgência de trabalhadores. Essa contingência marcava o ritmo dos trabalhos de preparo de um amplo esquema de recrutamento e condução dos trabalhadores até os seringais na floresta. Recorreria-se novamente à população do nordeste brasileiro.
Ainda em 1940, o presidente Vargas já havia autorizado a diretoria do Lloyd Brasileiro a conceder, gratuitamente, 4.000 passagens para trabalhadores nordestinos que desejassem ir para os seringais da Amazônia e do Acre. Mas esse ato ainda não estava ligado diretamente às ações de guerra especificamente, mas já havia uma tendência a se alinhar com os EUA. Assim como conseqüência da política brasileira de alinhamento, se volta parcialmente ao extrativismo decorrente de diversos acordos comerciais firmados na década de 1930 com a Alemanha. Os alemães tinham se tornado os maiores compradores da produção gomífera da Amazônia antes de eclodir a guerra na Europa.
Os americanos reagem a essa situação e, para alijar os alemães, passam a oferecer preços mais vantajosos antes ainda de o Brasil entrar na guerra. Os setores ligados aos interesses do extrativismo da borracha viam assim seus interesses convenientemente atendidos pelo governo Vargas.
Rapidamente a Coordenação da Mobilização Econômica do governo federal criou o SEMTA – Serviço Especial de Mobilização de Trabalhadores para o Amazonas. Também foi criado o SESP – Serviço Especial de Saúde Pública, que tinha por objetivo sanear a Amazônia e a região do Vale do Rio Doce, onde se produzia borracha e minério de ferro, matérias-primas estratégicas para os aliados.
O SEMTA assinou novo convênio com o Lloyd Brasileiro que forneceria passagens. Somente em Fortaleza cerca de 30 mil flagelados da seca estavam disponíveis para ser enviados imediatamente para os seringais. Mesmo que de forma pouco organizada, o DNI – Departamento Nacional de Imigração) ainda conseguiu enviar quase 15 mil pessoas para a Amazônia, durante o ano de 1942, metade das quais homens aptos ao trabalho nos seringais.
Mesmo com o fornecimento de passagens pelo Lloyd Brasileiro, com a abertura de créditos especiais pelo governo brasileiro e com a promessa do governo americano de pagar US$ 100 por um novo trabalhador instalado no seringal, as dificuldades eram imensas e pareciam intransponíveis. Isso só começou a ser solucionado em 1943 por meio do investimento maciço que o governo norte-americano facilitou para o SNAPP – Serviço de Navegação e Administração dos Portos do Pará – e da construção de alojamentos espalhados ao longo do trajeto percorrido pelos “soldados da borracha”, como agora eram conhecidos esse migrantes. A entrada em cena do SNAPP não resolveu o problema do transporte de longo curso dos migrantes que continuou sendo feito pelos navios do Lloyd Brasileiro.
Para acelerar ainda mais a transferência de trabalhadores para a Amazônia e aumentar significativamente a produção de borracha os governos americano e brasileiro encarregaram diversos órgãos do gerenciamento do programa. Pelo lado americano foi criado o BEW – Board of Economic Warfare, ligados a administração de Washington além das empresas de natureza privadas como a RDC – Rubber Development Corporation, a RRCO – Rubber Reserve Company, a RFC – Reconstrucction Finance Corporation e a DESCO – Defense Supllies Corporation. Pelo lado brasileiro, foram criados a SAVA – Superintendência do Abastecimento do Vale Amazônico e o BCB – Banco de Crédito da Borracha, além do já citado SEMTA – Serviço Especial de Mobilização de Trabalhadores para a Amazônia, depois substituído pela CAETA – Comissão Administrativa de Encaminhamento de Trabalhadores para a Amazônia.
Apesar de todos os problemas enfrentados (ou provocados) por essa mixórdia de órgãos encarregados para dar cabo à “Batalha da Borracha”, cerca de 60 mil pessoas foram enviadas para os seringais amazônicos entre 1942 e 1945. Muitos acabaram morrendo em razão das péssimas condições de transporte, alojamento e alimentação durante a viagem. As mortes desses migrantes são avaliadas a ascender a cifras superiores a 25 mil. Isso aconteceu pela absoluta falta de assistência médica, ou mesmo em função dos inúmeros problemas ou conflitos enfrentados nos seringais.
Mesmo assim a produção de borracha na Amazônia nesse período foi infinitamente menor do que o esperado, o que levou o governo americano, já a partir de 1944, a transferir muitas de suas atribuições para órgãos brasileiros. E tão logo a Guerra Mundial chegou ao fim, no ano seguinte, os EUA se apressaram em cancelar todos os acordos referentes à produção de borracha amazônica. O acesso às regiões produtoras do Sudeste Asiático se achava novamente aberto. A tecnologia para a produção da borracha sintética a partir do petróleo está dominada e o mercado internacional logo se normalizaria.
[NÃO CONTINUA]
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