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quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Agora vi uma atitude de Macho!... mas no Peru!...




O Congresso do Peru aprovou lei que proíbe por dez anos os alimentos geneticamente modificados no país. Ao fim desse prazo, haverá nova votação, dependendo dos conhecimentos que forem obtidos sobre o assunto até então. A decisão atinge especialmente os interesses da Monsanto, da Bayer e da Dow e visa preservar espécies vegetais tradicionais do país, como o milho branco, o milho roxo e as famosas batatas peruanas. 
Informação completa (em inglês) aqui


Aqui na nossa aldeia tupiniquim trabalha-se febrilmente (de baixo de grossas propinas, lobbie furioso e generoso caixa-2, pois não?...) para banir a informação no rótulo dos produtos a presença do transgênico no produto. 
Veja toda essa sacanagem aqui


Alias, essa foi uma das grandes falhas no governo Lula e seu partido dos galinhas vermelhas: ficar de 4 para os interesses dos produtores de sementes geneticamente modificadas (OGMs) e seus pesticidas correlatos. O governo brasileiro fechou os olhos para tudo relacionado à essa grave questão, desde que os galinhas vermelhas ascenderam ao governo federal em 2003.




Novo simbolo oficial do partido do Sapão da Lingua Presa 







Katia a Antropóloga - criadora da Abreugrafia




por José Ribamar Bessa Freire, no seu sitio Taqui Pra Ti

Nelson Rodrigues só se deslumbrou com "a psicóloga da PUC" porque não conheceu "a antropóloga da Folha". Mas ela existe. É a Kátia Abreu. É ela quem diz aos leitores da Folha de São Paulo, com muita autoridade, quem é índio no Brasil. É ela quem religiosamente, todos os sábados, em sua coluna, nos explica como vivem os "nossos aborígenes". É ela quem nos ensina sobre a organização social, a distribuição espacial e o modo de viver deles.
Podeis obtemperar que o caderno Mercado, onde a coluna é publicada, não é lugar adequado para esse tipo de reflexão e eu vos respondo que não é pecado se aproveitar das brechas da mídia. Mesmo dentro do mercado, a autora conseguiu discorrer sobre a temática indígena, não se intimidou nem sequer diante de algo tão complexo como a estrutura de parentesco e teorizou sobre "aborigenidade", ou seja, a identidade dos "silvícolas" que constitui o foco central de sua  - digamos assim - linha de pesquisa.
A maior contribuição da antropóloga da Folha talvez tenha sido justamente a recuperação que fez de categorias como "sílvicola" e "aborígene", muito usadas no período colonial, mas lamentavelmente já esquecidas por seus colegas de ofício. Desencavá-las foi um trabalho de arqueologia num sambaqui conceitual, que demonstrou, afinal, que um conceito nunca morre, permanece como a bela adormecida à espera de alguém que o desperte com um beijo. Não precisa nem reciclá-lo. Foi o que Kátia Abreu fez.
Com tal ferramenta inovadora, ela estabeleceu as linhas de uma nova política indigenista, depois de fulminar e demolir aquilo que chama de "antropologia imóvel" que seria praticada pela Funai. Sua abordagem vai além do estudo sobre a relação observador-observado na pesquisa antropológica, não se limitando a ver como índios observam antropólogos, mas como quem está de fora observa os antropólogos sendo observados pelos índios. Não sei se me faço entender. Mas em inglês seria algo assim como Observing Observers Observed.  
Os argonautas do Gurupi
Todo esse esforço de abstração desaguou na criação de um modelo teórico, a partir do qual Kátia Abreu sistematizou um ousado método etnográfico conhecido como abreugrafia que, nos anos 1940, não passava de um prosaico exame de raios X do tórax, uma técnica de tirar chapa radiográfica do pulmão para diagnosticar a tuberculose, mas que foi ressignificado. Hoje, abreugrafia é a descrição etnográfica feita com o método inventado por Kátia Abreu, no caso uma espécie de raio X das sociedades indígenas.
Esse método de coleta e registro de dados foi empregado na elaboração dos três últimos artigos assinados pela antropóloga da Folha: Uma antropologia imóvel (17/11), A Tragédia da Funai(03/11/) e Até abuso tem limite (27/10) que bem mereciam ser editados, com outros, num livro intitulado "Os argonautas do Gurupi". São textos imperdíveis, que deviam ser leitura obrigatória de todo estudante que se inicia nos mistérios da antropologia. A etnografia refinada e apurada que daí resulta quebrou paradigmas e provocou uma ruptura epistemológica ao ponto de não-retorno.
A antropóloga da Folha aplicou aqui seu método revolucionário - a abreugrafia - que substituiu o tradicional trabalho de campo, tornando caducas as contribuições de Boas e Malinowski. Até então, para estudar as microssociedades não ocidentais, o antropólogo ia conviver lá, com os nativos, tinha de "viver na lama também, comendo a mesma comida, bebendo a mesma bebida, respirando o mesmo ar" da sociedade estudada, numa convivência prolongada e profunda com ela, como em  'Lama', interpretada por Núbia Lafayette ou Maria Bethania.
A abreugrafia acabou com essas presepadas. Nada de cantoria. Nada de anthropological blues.Agora, o antropólogo já não precisa se deslocar para sítios longínquos, nem viver um ano a quatro mil metros de altura, numa pequena comunidade nos Andes, comendo carne de lhama, ou se internar nas selvas amazônicas entre os huitoto, como fez um casal de amigos meus. E tem ainda uma vantagem adicional: com a abreugrafia, os antropólogos nunca mais serão observados pelos índios.
Em que consiste, afinal, esse método que dispensa o trabalho de campo? É simples. Para conhecer os índios, basta tão somente pagar entrevistadores terceirizados. Foi o que fez a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) que, por acaso, é presidida por Kátia Abreu. A CNA encomendou pesquisa ao Datafolha que, por acaso, pertence à empresa dona do jornal onde, por acaso, escreve Kátia. Está tudo em casa. Por acaso.
Terra à vista
Os pesquisadores contratados, sempre viajando em duplas - um homem e uma mulher - realizaram 1.222 entrevistas em 32 aldeias com cem habitantes ou mais, em todas as regiões do país. Os resultados mostram que 63% dos índios têm televisão, 37% tem aparelho de DVD, 51% geladeira, 66% fogão a gás e 36% telefone celular. "A margem de erro" - rejubila-se o Datafolha - "é de três pontos percentuais para mais ou para menos".
"Eu não disse! Bem que eu dizia" - repetiu Kátia Abreu no seu último artigo, no qual gritou "terra à vista", com o tom de quem acaba de descobrir o Brasil. O acesso dos índios aos eletrodomésticos foi exibido por ela como a prova de que os "silvícolas" já estão integrados ao modo de vida urbano, ao contrário do que pretende a Funai, com sua "antropologia imóvel" que "busca eternizar os povos indígenas como primitivos e personagens simbólicos da vida simples". A antropóloga da Folha, filiada à corrente da "antropologia móvel", seja lá o que isso signifique, concluiu:
- "Nossos tupis-guaranis, por exemplo, são estudados há tanto tempo quanto os astecas e os incas, mas a ilusão de que eles, em seus sonhos e seus desejos, estão parados, não resiste a meia hora de conversa com qualquer um dos seus descendentes atuais".
Antropólogos da velha guarda que persistem em fazer trabalho de campo alegam que Kátia Abreu, além de nunca ter conversado sequer um minuto com um índio, arrombou portas que já estavam abertas. Qualquer aluno de antropologia sabe que as culturas indígenas não estão congeladas, pois vivem em diálogo com as culturas do entorno. Para a velha guarda, Kátia Abreu cometeu o erro dos geocêntricos, pensando que os outros estão imóveis e ela em movimento, quando quem está parada no tempo é ela, incapaz de perceber que não é o sol que dá voltas diárias em torno da terra.
No seu artigo, a antropóloga da Folha lamenta que os índios "continuem morrendo de diarreia". Segundo ela, isso acontece, não porque os rios estejam poluídos pelo agronegócio, mas "porque seus tutores não lhes ensinaram que a água de beber deve ser fervida". Esses tutores representados pela FUNAI - escreve ela - são responsáveis por manter os índios "numa situação de extrema pobreza, como brasileiros pobres". Numa afirmação cuja margem de erro é de 3% para mais ou para menos, ela conclui que os índios não precisam de tutela.
- Quem precisa de tutela intelectual é Kátia Abreu - retrucam os antropólogos invejosos da velha guarda, que desconhecem a abreugrafia. Eles contestam a pobreza dos índios, citando Marshall Sahlins através de postagem feita no facebook por Eduardo Viveiros de Castro:
‎"Os povos mais 'primitivos' do mundo tem poucas posses, mas eles não são pobres. Pobreza não é uma questão de se ter uma pequena quantidade de bens, nem é simplesmente uma relação entre meios e fins. A pobreza é, acima de tudo, uma relação entre pessoas. Ela é um estatuto social. Enquanto tal, a pobreza é uma invenção da civilização. Ela emergiu com a civilização..."
Miss Desmatamento
A conclusão mais importante que a antropóloga da Folha retira das pesquisas realizadas com a abreugrafia é de que os "aborígenes", já modernizados, não precisam de terras que, aliás, segundo a pesquisa, é uma preocupação secundária dos índios, evidentemente com uma margem de erro de três pontos para mais ou para menos.
- "Reduzir o índio à terra é o mesmo que continuar a querer e imaginá-lo nu" - escreve a antropóloga da Folha, que não quer ver o índio nu em seu território. "Falar em terra é tirar o foco da realidade e justificar a inoperância do poder público. O índio hoje reclama da falta de assistência médica, de remédio, de escola, de meios e instrumentos para tirar o sustento de suas terras. Mais chão não dá a ele a dignidade que lhe é subtraída pela falta de estrutura sanitária, de capacitação técnica e até mesmo de investimentos para o cultivo".
A autora sustenta que não é de terra, mas de fossas sépticas e de privadas que o índio precisa. Demarcar terras indígenas, para ela, significa aumentar os conflitos na área, porque "ocorre aí uma expropriação criminosa de terras produtivas, e o fazendeiro, desesperado, tem que abandonar a propriedade com uma mão na frente e outra atrás".
Ficamos, então, assim combinados: os índios não precisam de terra, quem precisa são os fazendeiros, os pecuaristas e o agronegócio. Dados apresentados pela jornalista Verenilde Pereira mostram que na área Guarani Kaiowá existem 20 milhões de cabeças de gado que dispõem de 3 a 5 hectares por cabeça, enquanto cada índio não chega a ocupar um hectare.
Um discípulo menor de Kátia Abreu, Luiz Felipe Pondé, também articulista da Folha, tem feito enorme esforço para acompanhar a produção intelectual de sua mestra, usando as técnicas da abreugrafia, sem sucesso, como mostra artigo por ele publicado com o título Guarani Kaiowá de boutique (9/11), onde tenta debochar da solidariedade recente aos Kaiowá que explodiu nas redes sociais.
Kátia Regina de Abreu, 50 anos, empresária, pecuarista e senadora pelo Tocantins (ex-DEM,atual PSD), não é apenas antropóloga da Folha. É também psicóloga formada pela PUC de Goiás, reunindo dois perfis que deslumbrariam Nelson Rodrigues.
Bartolomé De las Casas, reconhecido defensor dos índios no século XVI, contesta o discurso do cronista do rei, Gonzalo Fernandez de Oviedo, questionando sua objetividade pelo lugar que ele ocupa no sistema econômico colonial:  
- “Se na capa do livro de Oviedo estivesse escrito que seu autor era conquistador, explorador e matador de índios e ainda inimigo cruel deles, pouco crédito e autoridade sua história teria entre os cristãos inteligentes e sensíveis”.
O que é que nós podemos escrever na capa do livro "Os Argonautas do Gurupi" de Kátia Abreu, eleita pelo movimento ambientalista como Miss Desmatamento? Que crédito e autoridade tem ela para emitir juízos sobre os índios? O que diriam os cristão inteligentes e sensíveis contemporâneos? Respostas em cartas à redação, com a margem de erro de 3% para mais ou para menos.

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Lula - Um ódio amargo e intestino


por Weden, no blog do Nassif

Lula é um político brasileiro com defeitos e virtudes. Se você não conseguir ver uma coisa ou outra é porque, certamente, a cegueira da paixão ou do ódio está tomando o seu corpo como um câncer.

O que se percebe no caso de Lula é que o ódio intenso tenta, sobremaneira, vencer o amor intenso. É uma luta. A luta entre o amor e o ódio a esse personagem da história brasileira.
Outros já experimentaram do mesmo fel. Mas não sei se há concorrentes para Lula. Talvez nem Getúlio.

Quantitativamente, Lula está em vantagem. Mas os odiadores acreditam que seu ódio seria de melhor qualidade, uma espécie de crème de la crème do ódio - um ódio insuperável por qualquer amor de multidões.

É um ódio cultivado com gotas de ira diárias nas páginas dos jornais. E de revistas. Cultivado com olhos de sangue, faca entre os dentes, espinhos nas pontas dos dedos.

Só nos últimos meses, Lula já "esteve" por trás do relatório do CPI da Cachoeira, teve caso com a mulher presa na última operação da PF, já tentou adiar o julgamento, já produziu provas para se vingar de Perillo (porque ele teria sido o primeiro a avisá-lo do mensalão), já tentou subornar Deus para que terminasse a obra no domingo.

A paixão amorosa conhecemos bem. Vem daqueles que se identificaram com ele e com ele conseguiram ser lembrados pela primeira vez na história da política brasileira: seja pelos programas sociais, seja pela ascensão econômica, ou até simplesmente pelas características pessoais, culturais e linguísticas. Vem também do louvor à camisa, ao vermelho da camisa do PT.

Mas encontrar representantes do ódio não é tão difícil também. E, como qualquer sentimento que desafie a racionalidade, eles encontrarão justificativas em qualquer coisa.

Mesmo que o ódio se disfarce de termos falsamente conceituais (lulo-petismo, lulo-comunismo, lulo-qualquercoisismo), o ódio a Lula não é um ódio-conceito. Não é abstrato. É material. Corpóreo. Figadal. Biliar. Visceral.

Também não é ódio consequência. Não é um "ódio, porque..." É um "ódio ódio", um ódio em si mesmo, um ódio singular absoluto, que se disfarça de motivos: linguísticos, culturais, morais, econômicos, etc, mas sempre ódio.

Lula já foi acusado de trair a mulher, de violentar o companheiro de cela, de roubar o Brasil, de pentecostalizar a África, de fortalecer "ditaduras" latino-americanas, africanas, asiáticas, de se curar do câncer em hospital particular (sim, uma acusação), de assassinar passageiros de avião, de dar o título à Vila Isabel, de provocar a fuga do vilão no final da novela das oito; já foi acusado de dançar festa junina, de beber vinho caro, de torcer para o Corinthians, de comer buchada de bode, de ter amputado o próprio dedo para receber pensão, de ter a voz rouca, de ser gente, de estar vivo, de ter nascido...

Só um conselho para os odiadores: o inverso do amor não é o ódio, mas a indiferença. No caso em questão, o ódio só acentua e inflama a paixão daqueles que, em maioria (dos votos?...), acabarão levando vantagem.

Sejam indiferentes a Lula, e a história se encarregará de fazer o resto.

NOTA DOS ÍNDIOS (espantados?...): que meiguinha a frase de fechamento do texto!... o cara joga no time do Milênio?...

COMENTÁRIO 1 - Artaud:  O texto não se refere à habilidade política. Não se refere ao jogo político. Não se refere a prática de fazer ou desfazer alianças para avançar ou mesmo para permanecer na raia, no centro do poder.
Trata, o texto, de um ódio classista. Um visceral ódio por uma figura que ousou quase equiparar a antiga classe média alta com o poulacho (leia-se aqui mesmo no blog, num post mais abaixo, um texto de socialite Danuza Leão. Lá madame explicita claramente as raízes desse ódio ao metalúrgico).
Sim, banco, banqueiros e grandes empresários, e/ou magnatas ganharam muito dinheiro sob o governo Lula. Ganharam também sob outros governos. E continuarão ganhando em futuros governos. São uma minoria da minoria da minoria. Não lêem a Veja, mas também não lêem esse blog aqui. Não lêem Jabor assim como não lêem Mino Carta. Vivem num outro planeta terra. Banqueiros e magnatas, tenho a impressão-quase-certeza que se divertem muito com esse ódio das classes médias(sic) dedicado ao presidente operário. Magnatas não estão nem um pouco preocupados que o porteiro do condomínio de luxo passou a mão na poupança e foi fazer compras na Bloomingdale´s
Leia novamente o texto do Weden. Não sob a perspectiva luxuosa do jogo político histórico. Mas sob a perpectiva da qual ele, o texto, faz clara referência: a perspectiva da mesquinharia mundana e burra da pequena neo burguesia brasileira.

COMENTÁRIO 2 - BernardoMan:  Vou protestar. Nem todos que odeiam o Lula são neoburgueses.
Muitos são apenas burros e mal informados mesmo, nunca gostaram de estudar história do Brasil, não tem dimensão dos fatos e ficam indignados com "tanta" denúncias de corrupção, [já que] antes "não tinha" isso.  Massa-de-manobra!...

domingo, 25 de novembro de 2012

NÓS é que seremos Gaza amanhã




por Chris Hedges,  no Truthdig - (tradução de Baby Siqueira Abrão, publicado no Redecastorphoto )



Gaza é a janela de nossa futura distopia. A crescente divisão entre a elite do mundo e sua miserável massa de humanidade é mantida por meio de uma violência em espiral. Muitas regiões empobrecidas do planeta, que caíram no abismo econômico, começam a assemelhar-se a Gaza, onde 1,6 milhões de palestinos vivem no maior campo de concentração do planeta [1 - ver notas da tradutora no final do post].

Essas zonas de sacrifício, cheias de pessoas deploravelmente pobres, presas em favelas miseráveis ou em aldeias cujas casas têm paredes de barro, cada vez mais vêm sendo sitiadas por cercas eletrônicas, monitoradas por câmeras de vigilância e drones, e rodeadas por guardas de fronteira ou unidades militares que atiram para matar.

Essas distopias de pesadelo se estendem da África subsaariana ao Paquistão e à China. Nesses locais, assassinatos propositais são executados, ataques militares brutais são feitos a pessoas deixadas sem defesa, sem exército, sem marinha e sem força aérea. Todas as tentativas de resistência, embora ineficazes, deparam com a carnificina que caracteriza a moderna indústria da guerra.

No novo cenário global, como nos territórios ocupados por Israel e nos projetos imperialistas dos EUA no Iraque, no Paquistão, na Somália, no Iêmen e no Afeganistão, massacres de milhares de inocentes indefesos são classificados como “guerra”.

A resistência é denominada provocação, terrorismo ou crime contra a humanidade. O respeito às leis, assim como as mais básicas liberdades civis e o direito à autodeterminação, é uma ficção usada como relações-públicas para aplacar a consciência de quem vive nas zonas de privilégio.

Prisioneiros são rotineiramente torturados ou “desaparecidos”. A falta de alimentos e de suprimentos médicos são uma tática de controle aceita. Mentiras permeiam as ondas eletromagnéticas (rádios e TVs). Grupos religiosos, raciais e étnicos são demonizados. Chovem mísseis sobre casebres de alvenaria, unidades mecanizadas atiram em aldeões desarmados, canhoneiras esmagam campos de refugiados com bombardeios pesados, e os mortos, incluindo crianças, enfileiram-se em corredores de hospitais aos quais faltam eletricidade e medicamentos.

O colapso iminente da economia internacional, os ataques ao clima e suas consequências, como secas, alagamentos, declínio rápido de safras e aumento no preço dos alimentos estão criando um universo onde o poder se divide entre elites restritas, que têm nas mãos sofisticados instrumentos de morte, e massas enraivecidas.

As crises vêm incentivando uma guerra de classes que sobrepujará tudo aquilo que Karl Marx poderia ter imaginado. Elas estão construindo um mundo onde a maioria terá fome e viverá com medo, enquanto poucos irão se empanturrar com delícias em fortins protegidos. E mais e mais pessoas serão sacrificadas para manter esse desequilíbrio.

Por ter poder para isso, Israel – assim como os Estados Unidos – desrespeitam [2] o direito internacional para manter na miséria uma população dominada. A presença continuada das forças de ocupação israelenses [nos Territórios Palestinos Ocupados- TPOs] desafia quase cem resoluções do Conselho de Segurança da ONU pedindo sua retirada [dos TPOs].

O bloqueio israelense a Gaza, estabelecido em junho de 2007, é uma forma brutal de punição coletiva que viola o artigo 33 da IV Convenção de Genebra, que determina as regras para a “proteção de civis em tempo de guerra”.

O bloqueio transformou Gaza num pedaço de inferno, num gueto administrado por Israel onde milhares morrem, incluindo os 1,4 mil [são quase 1,5 mil] civis assassinados na incursão israelense de 2008. Com 95% das fábricas fechadas, a indústria palestina virtualmente parou de funcionar. Os restantes 5% operam com 25% a 50% de sua capacidade. Até o setor pesqueiro está moribundo. Israel recusa-se a permitir que os pescadores ultrapassem três milhas náuticas da costa, e dentro desse limite os barcos pesqueiros com frequência são alvo dos tiros israelenses.

As patrulhas de fronteira israelenses confiscaram 35% das terras cultiváveis de Gaza para criar nelas zonas-tampões [3].

O colapso da infraestrutura e o confisco israelense dos aquíferos fazem com que em muitos campos de refugiados, como Khan Yunis, não haja água corrente.

A Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados Palestinos (UNRWA, na sigla em inglês) estima que 80% de todos os habitantes de Gaza dependem, atualmente, de ajuda alimentar. E a alegação israelense de autodefesa esconde o fato de que Israel mantém uma ocupação ilegal e viola o direito internacional ao impor a punição coletiva aos palestinos.

Foi Israel que escolheu aumentar a violência quando, durante uma incursão a Gaza no início do mês, suas forças mataram um garoto de 13 anos. À medida que o mundo se arrebenta, este se torna o novo paradigma: senhores da guerra modernos se inundam com tecnologias e armas aterrorizantes, que matam povos inteiros.

Fizemos [os estadunidenses] o mesmo no Afeganistão, no Iraque, no Paquistão, no Iêmen e na Somália.

As forças do mercado e os mecanismos militares que protegem essas forças são a única ideologia que governa os Estados industriais e o relacionamento dos seres humanos com o mundo natural. É uma ideologia que resulta em milhões de mortos e outros milhões de desalojados no mundo moderno. E a espantosa/abominável álgebra dessa ideologia significa que essas forças irão, eventualmente, também desencadear-se sobre nós.

Aqueles que não são úteis para as forças do mercado são considerados descartáveis. Não têm direitos nem legitimidade. Sua existência, seja em Gaza, seja em cidades pós-industriais doentes como Camden, Nova Jersey, é considerada dejeto da eficiência e do progresso. Essas pessoas são vistas como refugo. E como refugo não têm voz nem liberdade, e podem ser extintas ou aprisionadas à vontade. Este é um mundo onde apenas o poder corporativo e o lucro são sagrados. É um mundo de barbárie.

“Ao dispor do poder de trabalho humano, o sistema disporia, incidentalmente, da entidade “ser humano” sob os pontos de vista físico, psicológico e moral”, escreveu Karl Polanyi [4] em The Great Transformation [A grande transformação]. E continua: 

"Privados da cobertura protetora de instituições culturais, os seres humanos pereceriam diante dos efeitos da exposição social; morreriam como vítimas de deslocamentos sociais agudos em consequência do vício, do crime e da fome. A natureza seria reduzida a seus elementos, com vizinhanças e paisagens violadas, rios poluídos, segurança militar ameaçada, poder de produzir alimentos e matéria prima destruído".

"Finalmente, a administração do mercado de compra de poder periodicamente liquidaria empresas comerciais porque a escassez e a fartura de dinheiro provariam ser tão desastrosas para os negócios como os alagamentos e as secas para as sociedades primitivas".

"Sem dúvida, os mercados de trabalho, da terra e do dinheiro são essenciais para uma economia de mercado. Mas nenhuma sociedade pode agüentar os efeitos desse sistema de ficções brutas, nem mesmo pelo menor período, a menos que sua substância humana e natural, assim como sua organização de negócios, estejam protegidas contra os estragos desse moinho satânico".

Existem 47,1 milhões de estadunidenses que dependem de auxílio-alimentação para comer. As elites estão tramando acabar com esse auxílio, assim como com outros programas de “direitos” que evitam que os pobres se tornem miseráveis.

O ímpeto de trilhões de dólares do Medicare, Medicaid e de outros programas sociais, dado o impasse político em Washington e o aumento do “abismo fiscal”, agora parece incerto.

Há 50 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza, mas porque a linha da pobreza é tão baixa – US$ 22.350 para uma família de quatro pessoas – esse número nada significa. Acrescente-se a isso as dezenas de milhões de estadunidenses de uma categoria chamada “próxima à pobreza”, incluindo as famílias que tentam viver com menos de US$ 45 mil por ano e ter-se-ão ao menos 30% do país na pobreza.

Assim que essas pessoas perceberem que não haverá recuperação econômica, que seu padrão de vida continuará a cair, que foram enganadas, que a esperança no futuro é uma ilusão, elas se tornarão tão furiosas como os manifestantes da Grécia e da Espanha ou os militantes de Gaza ou do Afeganistão.

Os bancos e outras corporações financeiras entregaram trilhões em empréstimos sem juros do Federal Reserve, enquanto acumulavam US$ 5 trilhões, em grande parte pilhados do Tesouro dos EUA. Quanto mais essas disparidade e desigualdade mundiais forem perpetuadas, mais as massas se revoltarão e mais depressa replicaremos internamente o modelo israelense de controle doméstico – drones acima de nossas cabeças, todos os dissidentes criminalizados, equipes SWAT rompendo pelas portas, força mortal como modo aceitável de subjugação, alimentos usados como armas e vigilância constante.

Em Gaza e em outras partes doentes do globo vemos essa nova configuração de poder.

O que está acontecendo em Gaza, assim como o que ocorre com pessoas negras em comunidades marginais nos EUA, são o modelo. As técnicas de controle, sejam elas aplicadas por israelenses, sejam usadas por unidades de polícia militarizada nas guerras contra drogas de nossas cidades, sejam empregadas por forças militares especiais ou por mercenários no Paquistão, no Afeganistão ou no Iraque, são testadas primeiro e aperfeiçoadas nos fragilizados e nos despossuídos.

Nossa insensível indiferença ao apelo dos palestinos e das centenas de milhões de pobres empacotados em favelas urbanas na Ásia ou na África, assim como de nossa própria subclasse, significa que as injustiças cometidas contra eles serão cometidas contra nós. Ao falhar com eles, falhamos conosco.

À medida que o império dos EUA implode, as mais brutais formas de violência empregadas fora do império começam a migrar de volta para o país. Ao mesmo tempo, os sistemas internos de governança democrática calcificaram-se.

A autoridade centralizada está nas mãos de um setor executivo que serve, como escravo, aos interesses corporativos globais.

A imprensa e os poderes judiciário e legislativo tornaram-se desdentados e decorativos.

O espectro do terrorismo, como em Israel, é usado pelo Estado para desviar gigantescos gastos para a segurança do país, para a vigilância militar e interna.

A privacidade é abolida. A dissidência é traição. Os militares, com seu mantra de obediência cega e de força, caracterizam a ética sombria da cultura vasta. A beleza e a verdade são abolidas. A cultura é degradada em besteiras. A vida emocional e intelectual de cidadãs e cidadãos é devastada pelo espetáculo, pelo mau gosto e pela malícia, assim como por montões de analgésicos e narcóticos. A ambição cega, o desejo de poder e uma grotesca vaidade pessoal – exemplificadas por David Petraeus e sua ex-amante – são os motores do progresso.

O conceito de bem comum não faz mais parte do léxico do poder. Este, como a novelista J.M. Coetzee escreve, é a “flor suja da civilização”. É Roma sob Diocleciano. Somos nós. Os impérios, no final, decaem em regimes despóticos, assassinos e corruptos que enfim consomem a si mesmos. E nós, como Israel, agora tossimos sangue.
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Chris Hedges*, cuja coluna é publicada às segundas-feiras em Truthdig, passou quase duas décadas como correspondente internacional na América Central, no Oriente Médio, na África e nos Bálcãs. Escreveu reportagens em mais de 50 países e trabalhou para The Christian Science Monitor, National Public Radio, The Dallas Morning News e The New York Times, para o qual foi correspondente internacional por 15 anos.


Comentário da tradutora:

Quem me conhece sabe que penso exatamente como Hedges. Infelizmente, não tenho seu talento e meu artigo sobre esse assunto está só na forma de esboço. É preciso ler este texto para entender por que os sionistas estão pressionando tanto o FSMPL (Fórum Social Mundial pela Palestina Livre)-- trata-se de uma pedra no sapato de quem, como eles, vêm mostrando as garras na América Latina e dominando nossos governos. É preciso ler este texto para saber por que insisto tanto num foco de luta mais amplo, contra o sionismo.

Vamos deixar como está ou vamos reagir?

[1] Dada a vida que levam, em consequência do bloqueio e dos ataques genocidas de Israel, os habitantes de Gaza preferem usar a expressão “campo de extermínio”.

[2] No original, flout, que também significa caçoar, zombar – termos mais apropriados ao que Israel e EUA fazem com o direito internacional.

[3] Zonas-tampões são terras palestinas que Israel confisca para manter, entre a linha de fronteira e Gaza (ou as vilas e cidades da Cisjordânia), uma área vazia, de acesso proibido aos palestinos, cercada e vigiada por soldados armados.

[4] Ver Karl Polanyi (em inglês). Embora o trecho citado neste texto seja interessante, é preciso manter um olhar crítico em Polanyi. Ele falhou exatamente onde o outro Karl, o Marx, acertou. Como filósofo, Marx foi fundo na ontologia para entender a formação da riqueza e do capital, ao passo que Polanyi não fez senão um sobrevoo nessas mesmas questões.

sábado, 24 de novembro de 2012

Economia Verde - Histórico de Desenvolvimento e o paradigma de dominação



por Michael F. Schmidlehner(*) – trecho do documentário O Acre que os Mercadores da Natureza escondem

Em meados da década de 1940, Theodor W. Adorno e Max Horckheimer, após terem fugido do Holocausto alemão para a Califórnia, investigaram os processos sociais que haviam possibilitado a erupção do nacional socialismo e analisaram a busca histórica da sociedade moderna de livrar-se do poder dos mitos e construir um mundo baseado na racionalidade.

Em sua crítica do esclarecimento (Horckheimer, Adorno, 1985) eles demonstram que este projeto é sentenciado a falhar, que a ideia da libertação do homem pela racionalidade inevitavelmente recai no mito, e que uma sociedade que se entende como esclarecida não é imune ao totalitarismo.

Horckheimer e Adorno ainda analisaram o entrelaçamento antagônico, a relação dialética específica, que cada sociedade possui com a natureza. O elemento que caracteriza a relação com a natureza, tanto dos regimes fascistas, quanto das sociedades “racionais” capitalistas foi descrito por eles como paradigma de dominação da natureza.

Enquanto os dois filósofos exilados nos Estados Unidos ainda refletiam sobre as causas das recém passadas atrocidades do Nazismo, realizou-se neste mesmo país uma reunião de governantes de 44 países que reorganizaria a futura ordem econômica global e daria início a novas formas de violência no mundo. Na conferência de Bretton Woods em 1944 foram decididos a criação do Banco Mundial e do Fundo Internacional Monetário (FMI). O dólar estadunidense foi, através de um sistema de taxas fixas de câmbio entre as moedas, estabelecido internacionalmente como moeda de reserva. As medidas tomadas nesta reunião pavimentaram o caminho para a expansão do sistema capitalista em âmbito global que se daria nas décadas seguintes.

Na sua fala inaugural no ano 1949, o presidente Harry Truman enfatizou a responsabilidade dos países ricos de combater a pobreza no resto do mundo. Eles deveriam auxiliar os países que até então não faziam parte do sistema capitalista – e a partir de agora foram declarados de forma indiferenciada “pobres” – através do desenvolvimento econômico. Justificado e impulsionado por este discurso de desenvolvimento (Escobar 1995), o modelo de economia estadunidense, de consumo e de produção em massa, baseado principalmente na queima de combustíveis fósseis, chamado de Fordismo – em referência ao fabricador de automóveis Ford – reproduziu-se e se multiplicou no mundo inteiro. Iniciou-se assim um inédito ataque à natureza e às sociedades consideradas “subdesenvolvidas”.

Megaprojetos infraestruturais foram implementados para facilitar a exploração dos recursos naturais, e promovida a abertura de mercados de consumo nos países periféricos, enquanto o valor foi agregado nos países centrais. 

Sustentabilidade – reformulando o discurso 

Na década de 1970, os desastrosos impactos ambientais do desenfreado crescimento econômico não puderam mais ser ignorados. Começou a se articular a partir da sociedade no mundo inteiro o movimento ambientalista.

Este movimento inicialmente reivindicou uma mudança de paradigma, a partir do entendimento que crise ambiental vinha sendo causada pelo consumismo nos países centrais e pela sede de extrair matérias primas para suas indústrias.

Os governos também tinham que reagir. Inúmeros estudos foram elaborados por especialistas ambientais, tornando assim a discussão mais técnica e, aos poucos, afastando-a da sociedade. As Organizações Não Governamentais (ONGs) ambientalistas ganharam importância e se tornaram os principais protagonistas do discurso ambientalista. Entre os grandes estudos encomendados pelos governos no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU) destaca-se o Relatório Brundtland. Este relatório, publicado em 1987 sob o título “Nosso Futuro Comum”, introduziu o conceito do desenvolvimento sustentável, com a argumentação de que meio ambiente e crescimento econômico podem e devem ser vistos como não conflitantes. A partir daí começou, em torno do novo conceito, um processo de profunda reformulação do discurso ambientalista, adaptando-se gradativamente aos interesses dominantes e afastando-o da ideia de uma mudança paradigmática. 

Consenso de Washington 

Nos arranjos da economia global houve novamente uma importante reorganização a partir da década de 1980. As instituições fundadas em Bretton Woods – FMI e Banco Mundial – tomaram juntas com o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos uma série de medidas, também conhecidas como o Consenso de Washington, visando a maior abertura de mercados e a flexibilização do capital. As conseqüentes ondas de privatização e a expansão do raio de ação de empresas multinacionais deram início à era do neoliberalismo. Os governos, sob guia dos Estados Unidos, pareciam apostar naquilo que chamaram a “autorregulação dos mercados”. A velocidade das vendas e compras de novos instrumentos financeiros como Futures, Swaps, Hedge Funds etc, aumentou muito com o uso de sistemas computadorizados. Entretanto, a flexibilização do capital não causou o equilíbrio dos mercados, mas ao contrário, criou bolhas [especulativas e irreais] de mercado, que mais tarde causariam o colapso de economias nacionais [inclusive da parte central do mundo moderno, incluindo EUA e Europa].

Paralelamente, [ocorre] a expansão dos direitos de propriedade intelectual, inclusive permitindo patentes sobre seres vivos e a harmonização destes direitos em âmbito global, foi promovida, viabilizando a apropriação e monopolização de recursos genéticos, ou seja, abrindo as portas para a Biopirataria.

Regulação pós-fordista 

Neste contexto, de novos mecanismos de acumulação de capital, situam-se os dois principais acordos que foram criados na Eco 92, a Convenção do Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC) e a Convenção da Diversidade Biológica (CDB). Se por um lado estas convenções procuraram ganhar controle sobre os desequilíbrios que o capitalismo vem causando na natureza e nas sociedades, por outro lado, elas refletem e consolidam os pressupostos da economia neoliberal e aquilo que foi descrito como a regulação pós-fordista da natureza (Brand Görg 2003), reafirmando assim o paradigma da dominação.

O predomínio do interesse comercial no âmbito da ONU ficou ainda mais óbvio no processo que lidou com a inclusão das florestas no Mecanismo de Desenvolvimento
Limpo (MDL) do protocolo de Quioto, em 2010, como instrumento de compensação de parte das emissões dos países industrializados. Esta inclusão deu início aos projetos de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (REDD). Não obstante o fato de 80% das emissões serem provenientes das indústrias e apenas cerca de 20% de desmatamento ou degradação florestal, o ônus de consertar o clima foi invertido, atribuindo-o aos povos das florestas e, gradualmente, isentando as indústrias poluidoras desta responsabilidade. A instrumentalização das florestas como sumidouro de carbono representa mais uma ameaça para os direitos e territórios dos povos indígenas e comunidades locais.

A intenção estratégica da Economia Verde

Ao longo das últimas três décadas esses processos criaram as condições para que a natureza se torne agora a base de um novo sistema de acumulação de capital.

Este novo sistema – de forma vaga e trivializada chamado Economia Verde – não só deverá viabilizar o contínuo crescimento das indústrias exploradoras e poluidoras, mas, sobretudo, acarretará na invenção de uma gama de novos produtos financeiros, em grande parte baseados em diversos tipos de eco-créditos.

Estes eco-créditos, gerados a partir dos serviços ambientais, tais como sequestro de carbono, primeiramente serão adquiridos por indústrias poluidoras ou governos e empresas multinacionais que, através de megaprojetos, causam danos para o meio ambiente ou para comunidades locais. Eles conseguem assim compensar suas emissões ou impactos socioambientais. Desta forma, a lógica pós-fordista da flexibilização e desterritorialização se estende – além da flexibilização do capital financeiro e da mão de obra – até os processos naturais que, agora redefinidos como “serviços” se tornam intercambiáveis e desvinculados do território. Qualquer degradação ambiental poderá ser compensada através de eco-créditos gerados em algum outro lugar do mundo. Em uma segunda etapa, os créditos serão vendidos e comprados nas bolsas de valores para atrair o capital especulativo.

Quais são realmente os motivos para a promoção da Economia Verde pelas grandes ONGs em parceria com as multinacionais e propostas pelos governos no âmbito da ONU? Observando o avanço das práticas neoliberais destrutivas e excludentes no mundo inteiro nas últimas décadas, dificilmente podemos acreditar que se trata da genuína preocupação com sustentabilidade e erradicação de pobreza, que visaria – como especifica a Iniciativa de Economia Verde do Programada de Meio Ambiente das Nações Unidas: equidade, bem-estar social e humano, reduzindo significativamente os riscos ambientais e a escassez ecológica (PNUMA 2011).


(*) Filósofo austríaco formado pela Universidade de Viena, vive no Acre desde 1995

Porque hoje é sábado: As musicas do Cine Brasil




Durante a década de 1950 e 1960 o programa máximo nos finais de semana em São Bento do Sul eram as seções de cinema no Cine Brasil. Para anunciar as suas seções havia um alto-falante, daqueles em formato de cone, instalado bem no topo do prédio do cinema, que reproduzia  musica aproximadamente uma hora antes das seções  programadas, o que nos sábados era sempre a partir das 19:00 horas. A musica era ouvida em todo o centro da cidade.

Acontece que os caras aparentemente tinham só um disco, de musica orquestrada, e que sempre repetiam... anos a fio. Na época chegava a enjoar, mas hoje, várias gerações depois, acaba batendo um saudosismo. Pelo menos eram peças de qualidade.

O disco que tocavam invariavelmente era um da orquestra de Billy Vaughn, com o titulo no Brasil de “Crepúsculo”, que selecionei duas musicas das mais executadas, a guisa de matar a saudade e como registro para as gerações mais novas:










OBSERVAÇÃO: Na foto que ilustra este post, de 1947, ainda não parece o alto-falante no topo do prédio, que permite supor que foi instalado mais tarde. O disco de Billy Vaughn é lançamento no Brasil de 1959/60, também... 

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

A nação em festa com a libertação de um perseguido político




por Edson Lima, em seu blog

A Justiça do Distrito Federal condenou hoje Carlinhos Cachoeira a 5 anos  de prisão em regime semiaberto, por vários crimes. Imediatamente após proferir a sentença, a  juíza Ana Claudia de Oliveira Costa Barreto determinou a soltura do cabra.

Segundo o Código Penal, a pena em regime semiaberto deve ser cumprida em uma colônia penal, mas também permite que o condenado durma na colônia e trabalhe ou estude fora em cursos de segundo grau ou superior..

Na prática, o condenado recebe a liberdade condicional: fica livre (mas sem direitos políticos ou possibilidade de viajar), tendo de se apresentar regularmente à Justiça.

Cachoeira estava preso havia 9 meses. Até que ficou muito. Solto, ele que se cuide. Tem pelo menos umas 50 pessoas que querem vê-lo com o nariz cheio de formiga…

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Geopolitica não é para amadores



por O Escritor, no blog do Nassif


Os mágicos conhecem esse procedimento: distraia as pessoas, chamando a atenção delas para um foco, enquanto você realiza o truque em outro ponto.
1. Israel, como acontece após toda eleição presidencial americana, ataca e destrói alvos estratégicos em Gaza (destruíram até mesmo o equivalente ao Banco Central de Gaza), elimina os novos líderes do inimigo e impõe-se pela força do terror, obrigando o povo palestino a um longo processo de reconstrução.
Aproveita, também, para acelerar um pouco a sua política de genocídio, visando a base: nos últimos 13 anos, Israel mantém uma média de duas crianças palestinas assassinadas por semana.
2. Benjamin Netanyahu torna-se quase imbatível para disputar a eleição de janeiro vindouro. Cerca 90% dos israelenses apoiam a "ofensiva" contra os palestinos.
3. Os EUA dão um recado ao mundo, deixando claro que bloquearão qualquer resolução da ONU que condene o massacre perpetrado por Israel: a carta-branca continua valendo – o que eles fizerem, nós assinamos embaixo.
4. Israel e EUA dão um recado militar claro ao Irã. Reforçando o recado, três embarcações de assalto anfíbio são enviadas para a região, a pretexto de "possível retirada de cidadãos norte-americanos".
5. Israel testa pela primeira vez, com sucesso, seu sistema antimísseis, o Domo de Ferro.
6. O governo de Barack Obama dá à sua futura candidata presidencial, Hillary Clinton, a primeira missão internacional importante: garantir a "paz" na região – ou seja, o fim dos ataques de mísseis, depois que os objetivos estratégicos já foram alcançados.
7. A campanha Hillary-2016 é lançada sobre uma pilha de corpos, com apoios fundamentais (por exemplo, o do quarto homem mais rico do mundo).
8. O novo presidente egípcio, Mohamed Morsi, fortalece-se ante o Ocidente e ante os árabes, negociando o acordo de paz entre as partes.
Resultado: todos os agentes envolvidos nesta nova Operação Despistamento saem ganhando.
E o mundo todo focado somente nas vidas humanas virando cinzas.
Para quem esteja interessado neste aspecto "menor" da Geopolítica, câmera ao vivo aqui:

Economia Verde - mais um balaio de gatos neoliberalizante



Tudo que é financeiro, lamentavelmente, é econômico. Mas nem tudo que é econômico é financeiro!

por Amyra El Khalili, no promocional Em Missão de Paz 

Desde que foi instituído o MDL - Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, pelo Protocolo de Quioto (1997), estamos manifestando nossas preocupações com a maneira pela qual os negócios e os acordos vinham sendo conduzidos. A tendência que temos observado é, infelizmente, que o mercado de carbono e seus derivados está repetindo os modelos centralizadores, arriscados, limitados e desgastados, sob os quais se estabeleceram os contratos nos grandes centros financeiros. Analistas internacionais estimam um rombo de aproximadamente U$ 222 trilhões nos derivativos, o que equivale a três vezes o PIB mundial. A crise financeira internacional não acontece em outro planeta para que a euforia em relação aos créditos ambientais seja isenta de críticas e rechaços, como ocorreu durante a Rio+20 no evento paralelo Cúpula dos Povos.

É aqui mesmo, neste mercado global desregulamentado, que estão sendo negociados acordos entre governos e instituições financeiras com o aval de algumas ONGs ambientalistas, contrariando a lógica matemática mais racionalista e, tais créditos, sendo tratados como commodities, ou seja, mercadoria padronizada para compra e venda. A poluição é uma nova modalidade de mercadoria. Assim como a máfia do lixo, dos aterros sanitários, do lixo tóxico e do lixo atômico, estão fazendo do que deveria ser eliminado um "ativo ambiental".

Os argumentos que justificam o mercado de carbono são louváveis. O apelo para conter o aquecimento global é legítimo. As mudanças climáticas ocasionadas pela ação do ser humano estão mais que comprovadas cientificamente, ainda que alguns céticos se esforcem para derrubar teses e estudos consolidados. Porém, o modus operandi a que se pretende alcançar esses objetivos são questionáveis até para os mais monetaristas dos cientistas econômicos.

Os números apontados são discrepantes: estima-se que U$ 142 bilhões foram negociados nos derivativos de carbono, contra U$ 5 bilhões investidos diretamente em projetos de MDL. O que se verifica é que, de fato, há um mercado sem controle, formando uma bolha ambiental prestes a explodir, uma vez que o sistema financeiro mundial está totalmente entrelaçado por garantias que os bancos trocam entre os próprios bancos, as chamadas "trocas de chumbo". Há um movimento internacional atento, monitorando e denunciando fraudes e corrupções nesses mecanismos.

No sistema financeiro, não existe operação que não tenha garantia real. Não se pode formar um fundo climático sem que haja garantias de liquidez. Usarão todos os papéis que encontrarem pela frente para lastrear seus negócios de altíssimo risco no curtíssimo prazo.

É nesse contexto, que está o cerne da polêmica em relação à "economia verde". Resumindo, a crítica é procedente, pois se estrutura na crença que o mercado financeiro é soberano e tem capacidade para regular e promover ajustes com as forças do livre mercado, precificando a natureza e, com isso, estabelecendo prazos contratuais, ao gosto do freguês, sem metas e sem regras, opondo-se, assim, à política "comando controle" dos Estados.

Não foi por acaso que o documento final da Rio+20 desconsiderou os princípios acordados na Rio-92: o princípio do poluidor-pagador, o princípio da precaução e o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas.

Dessa forma, promove-se a via mais rápida para a financeirização dos bens ambientais, como água, biodiversidade, florestas (fauna, flora e patrimônio genético) e minério, com a conivência e aval dos governos, que transferem suas responsabilidades enquanto Estado para as corporações através do sistema financeiro nos modelos neoliberais mais agressivos dos últimos tempos. No entanto, para que isso aconteça, é necessário desmantelar leis ambientais, afrouxar a fiscalização, flexibilizar regras e engessar os movimentos sociais e ambientais.

Se um país não tem terra e água para plantar, compra (ou rouba) terras em outro continente. Esse movimento especulativo atrai todo tipo de negócios escusos. As terras mais cobiçadas são os territórios das populações tradicionais, caiçaras, indígenas e quilombolas. Os pequenos proprietários de terras, com mananciais, águas subterrâneas e represas e rios em suas propriedades, também são alvos dos especuladores, que prometem vantagens financeiras agindo com cartas de gaveta (side letters) de compra e venda de áreas vinculantes aos créditos de carbono e de compensações, usando, portanto, as áreas como garantias reais para negociar os tais títulos.

Esse movimento já ocorre na informalidade há 15 (quinze anos), à revelia dos órgãos normatizadores e fiscalizadores, colocando em risco a soberania nacional por conta de conflitos fundiários e rurais, entre outros fatores territoriais. O mais alarmante é a velha troca de votos por água. É delicada e preocupante a fragilidade das populações que não têm acesso à água, em quantidade e qualidade, e ao saneamento básico. Estas são reféns, há séculos, do voto de cabresto.

Agora, temos uma novidade eleitoral sofisticada: o voto de cabresto do REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação), e suas criativas variáveis, com a correria de diversos governadores e prefeitos assinando acordos com empresas estrangeiras. Resta saber quais são as bases jurídicas nas quais estão fundamentados todos esses acordos para que instituições financeiras internacionais administrem os bens ambientais desta nação. Outro caso interessante envolve ONGs, marketiando como se fossem instituições financeiras autorizadas a "funcionar" pelo Banco Central do Brasil. As ONGs anunciam produtos, sistemas de comercialização, cadastramento de clientes e negócios sob a lei das OSCs e OSCIPs. Isso pode?

Será que o mercado dos ativos ambientais, cuja natureza jurídica é incerta e extremamente confusa - quando camaleônicamente os players os tratam como commodities trocando, ao sabor dos ventos, para valores mobiliários (valores ambientais) ou para ativos ambientais e sabe-se lá que nome darão aos mesmos bois -, está isento de regras, normas, não se submete ao Código de Defesa do Consumidor, não será processado por prática de propaganda enganosa, entre outras arbitrariedades, abusando da falta de conhecimento técnico da população desavisada? São essas as perguntas que faremos aos futuros candidatos e aos seus partidos nas próximas eleições. 

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Como os historiadores do futuro vão descrever esse tal de "julgamento do mensalão"?...




por Mauro Santayana, no Jornal do Brasil

O julgamento da Ação 470, que chega ao seu fim com sentenças pesadas contra quase todos os réus, corre o risco de ser considerado como um dos erros judiciários mais pesados da História. Se, contra alguns réus, houve provas suficientes dos delitos, contra outros os juízes que os condenaram agiram por dedução. Guiaram-se pelos silogismos abengalados, para incriminar alguns dos réus.
O relator do processo não atuou como juiz imparcial: fez-se substituto da polícia e passou a engenhosas deduções, para concluir que o grande responsável fora o então ministro da Casa Civil, José Dirceu. Podemos até admitir, para conduzir o raciocínio, que Dirceu fosse o mentor dos atos tidos como delituosos, mas faltaram  provas, e sem provas não há como se condenar ninguém.


O julgamento, por mais argumentos que possam ser reunidos pelos membros do STF, foi político. Os julgamentos políticos, desde a Revolução Francesa, passaram a ser feitos na instância apropriada, que é o Parlamento. Assim foi conduzido o processo contra Luis XVI. Nele, de pouco adiantaram os brilhantes argumentos de seus notáveis advogados,  Guillaume Malesherbes, François Tronchet e Deseze, que se valiam da legislação penal comum.
O julgamento era político, e feito por uma instituição política, a Convenção Nacional, que representava a nação; ali, os ritos processuais cediam lugar à vontade dos delegados da França em processo revolucionário. A tese do poder absoluto dos parlamentares para fazer justiça partira de um dos mais jovens revolucionários, Saint-Just. Ela fora aceita, entre outros,  por Danton e por Robespierre, que se encarregou de expô-la de forma dura e clara, e com a sobriedade própria dos julgadores —  segundo os cronistas do episódio — aos que pediam clemência e aos que exigiam o respeito ao Código Penal, já  revogado juntamente com a monarquia.
“Não há um processo a fazer. Luís não é um acusado. Vocês não são juízes, vocês são homens de Estado. Vocês não têm sentenças a emitir em favor ou contra um homem, mas uma medida de segurança pública a tomar, um ato de providência nacional a exercer. Luís foi rei e a República foi fundada. E Robespierre, implacável, explica que, em um processo normal, o rei poderia ser considerado inocente, desde que a presunção de sua inocência permanecesse até o julgamento. E arremete:
Mas, se Luís é absolvido, o que ocorre com a Revolução? Se Luís é inocente, todos os defensores da liberdade passam a ser caluniadoresOs fatos posteriores são conhecidos.
O STF agiu, sob  aparente ira revolucionária de alguns de seus membros, como se fosse a  Convenção Nacional. Como uma Convenção Nacional tardia, mais atenta às razões da direita — da Reação Thermidoriana, que executou Robespierre, Saint-Just e Danton, entre outros — do que a dos montagnards de 1789. Foi um tribunal político, mas sob o mandato de quem? Quem os elegeu? E qual deles pôde assumir, com essa grandeza, a responsabilidade do julgamento político, que assumiu o Incorruptível? E qual dos mais exacerbados poderia dizer aos outros que deviam julgar como homens de Estado, e não como juízes?
Como o Tartufo, de Molière, que via a sua razão onde a encontrasse, foram em busca da teoria do domínio do fato, doutrina que, sem essa denominação, serviu para orientar os juizes de Nurenberg, e foi atualizada mais tarde pelo jurista alemão Claus Roxin. Só que odomínio do fato, em nome do qual incriminaram Dirceu, necessita, de acordo com o formulador da teoria, de provas concretas. Provas concretas encontradas contra os condenados de Nurenberg, e provas concretas contra o general Rafael Videla e o tiranete peruano Alberto Fujimori.
E provas concretas que haveria contra Hitler, se ele mesmo não tivesse sido seu próprio juiz, ao matar-se no bunker, depois de assassinar a mulher Eva Braun e sacrificar sua mais fiel amiga, a cadela  Blondi.  Não havendo prova concreta que, no caso, seria uma ordem explícita do ministro a alguém que lhe fosse subordinado (Delúbio não era, Genoino, menos ainda), não se caracteriza o domínio do fato. Falta provar, devidamente, que ele cometeu os delitos de que é acusado, se o julgamento é jurídico. Se o julgamento é político, falta aos juízes provar a sua condição de eleitos pelo povo.


Dessa condição dispunham os membros da Convenção Nacional Francesa e os parlamentares brasileiros que decidiram pelo impeachment do presidente Collor. As provas contra Collor não o condenariam (como não condenaram) em um processo normal. Ali se tratou de um julgamento político, que não se pretendeu  técnico, nem juridicamente perfeito, ainda que fosse presidido pelo então presidente do STF.
A nação, pelos seus representantes, foi o tribunal. O STF é o cimo do Poder Judiciário. Sua sentença não pode ser constitucionalmente contestada, mesmo porque ele é, também, o tribunal que decide se isso ou aquilo é constitucional, ou não. A História, mais cedo do que tarde, fará a revisão desse processo, para infirmá-lo, por não atender às exigências do due process of law, nem à legitimidade para realizar um julgamento político.
O julgamento político de Dirceu, justo ou não, já foi feito pela Câmara dos Deputados, que lhe cassou o mandato.