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terça-feira, 18 de junho de 2013
O mundo pergunta: Que esquizofrenia é essa?...
Por Juan Arias, do El País
Está gerando perplexidade, dentro e fora do país, a crise criada repentinamente no Brasil pelos protestos nas ruas, ocorridos primeiramente em cidades ricas, como São Paulo e Rio de Janeiro, e agora estendidas a todo o país e a brasileiros no exterior.
Neste momento, as perguntas para entender o que está acontecendo são mais numerosas que as respostas. Existe somente um certo consenso que o Brasil, até agora invejado internacionalmente, vive uma espécie de esquizofrenia ou paradoxo que ainda deve ser analisada e explicada.
Comecemos por algumas das perguntas.
Por que surge agora um movimento de protesto com os que já estão de volta em outros países do mundo quando, durante dez anos, o Brasil viveu como que anestesiado por seu êxito compartilhado e aplaudido mundialmente? O Brasil está pior hoje do que há dez anos? Não, está melhor. Pelo menos é mais rico, tem menos pobres e mais milionários. É mais democrático e menos desigual.
Então, como se explica que a presidenta Dilma Rousseff, com um consenso popular de 75% - um recorde que chegou a superar à popularidade de Lula - possa ser vaiada repetidamente na inauguração da Copa das Confederações, em Brasília, por quase 80 mil torcedores da classe média que puderam se dar ao luxo de pagar quase 400 dólares por uma entrada?
Por que saem às ruas para protestar contra o aumento dos preços dos transportes públicos jovens que normalmente não usam esses meios porque já tem carro, algo impensável dez anos atrás?
Por que protestam estudantes de famílias que, até pouco tempo, não haviam sonhado ver seus filhos pisando em uma universidade?
Por que aplaude aos manifestantes a classe média C, recém-saída da pobreza e que, pela primeira vez em sua vida, pode comprar uma geladeira, uma televisão e até uma moto ou um carro de segunda mão?
Por que o Brasil, sempre orgulhoso de seu futebol, parece estar agora contra o mundial, chegando a ofuscar a inauguração da Copa das Confederações com uma manifestação que produziu feridos, detenções e medo aos torcedores que compareceram ao estádio?
Por que protestos, alguns deles violentos, em um país invejado até pela Europa e Estados Unidos por seus desemprego quase nulo?
Por que se protesta nas favelas onde seus habitantes têm visto duplicada a sua renda e recuperada a sua paz, que havia sido roubada pelo narcotráfico?
Por que, de repente, se levantaram em pé de guerra os indígenas que possuem já 13% do território nacional e tem o Supremo Tribunal Federal sempre ao lado de suas reivindicações?
Será que os brasileiros são desagradecidos a quem os fez melhorar?
As respostas a todas essas perguntas que produzem uma espécie de perplexidade e assombro a tantos, começando pelos políticos, poderiam ser resumidas em poucas questões.
Em primeiro lugar se poderia dizer que, paradoxalmente, a culpa é de quem deu aos pobres um mínimo de dignidade: uma renda não miserável, a possibilidade de ter uma conta em um banco e acesso ao crédito para poder adquirir o que sempre foi um sonho para eles (eletrodomésticos, uma moto ou um carro).
Talvez o paradoxo se deva a isso: ao haver colocado os filhos dos pobres na escola, da qual gozaram seus pais e avós; ao haver permitido aos jovens, a todos - brancos, negros, indígenas, pobres ou não, ingressar em uma universidade; ao haver dado para todos um acesso gratuito à saúde; ao haver livrado aos brasileiros do antigo complexo de culpa de "vira-latas"; ao haver conseguido tudo aquilo que converteu o Brasil, em apenas 20 anos, em um país quase de primeiro mundo.
Os pobres chegados a uma nova classe média tem tomado consciência de terem dado um salto qualitativo na esfera do consumo e agora querem mais. Querem, por exemplo, alguns serviços públicos de primeiro mundo, que não o são; querem uma escola que, além de os acolher, prepare-os para o trabalho no futuro.
Querem hospital com dignidade, sem meses de espera, sem filas desumanas, onde sejam tratados como pessoas. Querem que, em 15 dias, não morram 25 recém-nascidos em um um hospital de Belém, no Pará.
E querem, sobretudo, o que lhes falta politicamente: uma democracia mais madura, em que a polícia não siga atuando como fazia na ditadura; querem partidos que não sejam, na expressão de Lula, um "negócio" para enriquecer; querem uma democracia onde exista uma oposição capaz de vigiar o poder.
Querem políticos com menor carga de corrupção; querem menos esbanjamento em obras que consideram inúteis quando ainda falta moradia para 8 milhões de famílias; querem uma justiça com menos impunidade; querem uma sociedade menos abismal em suas diferenças sociais. Querem os políticos corruptos na cadeia.
Querem o impossível? Não. Ao contrário dos movimentos de 68, que queriam mudar o mundo, os brasileiros insatisfeitos com o que já alcançaram, querem que os serviços públicos sejam como os do primeiro mundo. Querem um Brasil melhor. Nada mais.
Querem definitivamente aquilo que lhes foi ensinado para serem mais felizes (ou menos infelizes) do que foram no passado.
Escutei alguns dizerem "O que mais essa gente quer?" A pergunta me lembra aquela feita por algumas famílias em que os filhos se rebelam, mesmo depois de terem recebido tudo.
Às vezes, os pais se esquecem de que faltou algo que é essencial aos jovens: atenção, preocupação pelo que ele deseja e não pelo que às vezes se oferece a ele. Necessitam não apenas ser ajudados e protegidos, levados pela mão, querem aprender a ser eles os protagonistas.
E aos jovens brasileiros, que cresceram e tomaram consciência não apenas do que já tem, mas também do que podem alcançar, falta justamente que lhes deixem ser mais protagonistas de sua própria história, mais ainda quando demonstram ser tremendamente criativos.
Que o façam, isso sim, sem aumentar a violência - que já sobra neste país maravilhoso que sempre preferiu a paz à guerra. E que não se deixem cooptar por políticos que tentarão se aproveitar dos protestos para esvaziá-los de seu conteúdo.
Ontem, se lia em um cartaz: "País mudo é um país que não se muda". E também dirigido à polícia: "Não disparem contra os meus sonhos". Alguém pode negar a um jovem o direito de sonhar?
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