por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa
A resistência ao formalismo comprometedor das convenções que regem o
relacionamento nas comunidades cosmopolitas, nas quais o coletivo se
forma pela demarcação explícita do espaço individual, exige o espelho do
outro como referência.
No Brasil, somos tribo, e nossa tendência, como sociedade, é idealizar a
possibilidade de uma única e imensa taba. Essa natureza tribal desponta
ao longo da Copa do Mundo, produzindo o jogo quase infantil das
torcidas que se misturam, nomeando, a cada partida, o adversário comum
que deve ser provocado, com os chistes e as gozações cujo objetivo é
trazer todos, até mesmo os argentinos, para a comunidade informal e
descontraída dos adeptos do futebol.
Ao impor uma agenda em tudo contrária a essa natureza, nos meses que
antecederam a abertura da Copa do Mundo, a imprensa hegemônica fez uma
aposta arriscada na ruptura dessa teia de vínculos sociais que se forma
em todas celebrações por estas terras. Como na música de carnaval, tudo
pode acabar em cinzas simbólicas na quarta-feira, ou no dia 14 de julho,
a segunda-feira que vem depois da partida final no Maracanã.
Mas o mais importante já aconteceu: foi o resgate dessa natureza
cordial, a chance de um reencontro do brasileiro consigo mesmo.
Percebem-se, aqui e ali, resquícios do espírito-de-porco negativista e
ranzinza que se incorporou a certa parcela da população, tida como mais
educada e supostamente de renda mais elevada.
Os leitores de jornal são, majoritariamente, integrantes desse
contingente de brasileiros que não se sentem necessariamente parte da
sociedade onde desfrutam de privilégios. Foi para eles que se dirigiram
as mensagens rancorosas da imprensa nos últimos meses, e deles fluiu
para o ambiente midiatizado a repercussão do dissenso, contrário ao
espírito festivo da maioria.
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