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quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Economia Verde – de novo o embuste da financeirização do Meio Ambiente


Por Ana Paula Salviatti, na Carta Maior

Porta-voz do discurso ambientalista, carro chefe da 'nova política' da candidata pela Coligação Unidos pelo Brasil, Marina Silva retira sua concepção ecológica dos velhos Programas de Ajustamento Estruturais. Novidade?...

Só se for a dos papéis emitidos no mercado secundário, em busca, após as últimas crises econômicas, de reciclarem seus papéis podres com a injeção de liquidez produzida pela emissão dos Créditos de Carbono.

Discurso do novo

Estado e Democracia de Alta Intensidade, Democratizar a Democracia, governança robusta e a busca pela paz e harmonia entre os povos, são termos retirados do programa de Marina Silva, recentemente disponibilizado na internet. É um portfólio de governo. O discurso do novo é bastante conhecido pelos países que atravessaram as políticas de ajuste nos anos 80 e 90.

Então do que se trataria este novo?...

É necessário compreender que a demanda em defesa das condições ambientais é pauta antiga, levantada por pessoas publicas como o sindicalista Chico Mendes, morto em 1988, ou como do casal de extrativistas José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo, assassinados em 2001, no norte do país.

Chico Mendes era o defensor não do desenvolvimento sustentável, mas da defesa dos povos da floresta que demandavam que a selva Amazônica permanecesse de pé, o que exigia a proteção da mesma em relação aos interesses de mercado – externo e interno.

O longo e disputado percurso que levou décadas para incorporar a crise ecológica ao discurso do ambientalmente sustentável foi conquistado nos globalizados anos 90. O verbete defendido por agências internacionais pró-mercado é tão ecologicamente correto quanto as exigências por cortes orçamentários do Banco Mundial e FMI foram para a saúde e educação.

Enganava-se quem acreditou que a cartilha havia desaparecido. Afinal, não se falava mais dela. Provavelmente porque tenha sido reencadernada com uma estampa nova.

As soluções são conhecidas por todos - são as soluções de mercado, capazes de gerar liquidez através da criação de propriedade, conhecidas como privatização (e a descrição de suas ligações com as tensões enfrentadas cotidianamente na cidade e no campo é um dos grandes desafios atualmente enfrentados pelas pesquisas acadêmicas).

O que se viu nos anos 80 e 90 com o desmonte do já deficiente Estado, seguido da titularização da dívida é prolongado agora com a economia do desenvolvimento sustentável.

O que ocorre é a cooptação de uma crise ecológica com intuito de ser administrada dentro dos instrumentos de mercado desenvolvidos em um período de finanças liberadas.

Assim, o debate é qualificado e solucionado mediante a utilização de instrumentos de mercado, que em tempos de finanças liberadas são capazes de ampliar os limites dos negócios.

As propostas implementadas pelo Protocolo de Quioto instituíram o Mercado de Emissões, que nada mais é do que uma plataforma de negócios que opera na esfera financeira, fornecendo papéis no mercado primário (onde os títulos estão ligados com a economia produtiva, ou real), e ao mercado secundário (onde os títulos ‘derivam’ daqueles primeiros e são agrupados em inúmeros fundos de investimento).

Sabemos que hoje um título no mercado secundário é negociado em média 4 vezes no mesmo dia.

O discurso ambientalista - que se apresenta como única alternativa praticável de ecologia - está em vias de privatizar todo o complexo ecológico, gerando um novo e potente mercado.

A título de exemplo, um dos projetos que geram créditos de carbono são os conhecidos desertos verdes. Hectares e mais hectares de florestas nativas são postos no chão para darem lugar ao economicamente sustentável monocultivo de eucalipto transgênico que alimentará dentro de sete anos os altos-fornos onde são fundidos lingotes de ferro.

É o chamado “gusa verde” que, por economizar emissões de carbono no lugar de carvão mineral, é avaliado como um exemplo de sustentabilidade. Mesmo que para tanto sejam expulsos os antigos moradores destas áreas juntamente de toda a biosfera que vivia lá anteriormente, já que as plantações de monocultivo transgênico são estéreis à vida.

A produção de carvão vegetal através de florestas plantadas é um dos quatro exemplos citados pelo projeto da Coligação quando se trata da ampliação de produtos florestais. A estratégia definida é a de alavancar a participação brasileira no mercado mundial destes produtos, um dos nichos econômicos dos quais o país tem as maiores condições de se estabelecer como líder, segundo os dados apresentados. É a mais nova fronteira de mercado a ser investida.

Estamos falando de um dos muitos projetos que possuem investimento direto do Banco Mundial.

Transformar em títulos todo esse conjunto sem ter ao menos clareza do que está sendo feito é vender toda a fonte economicamente produtiva da qual os países de economia orientada como o nosso, ou, de forma mais moderna, países em desenvolvimento – e sustentável – são baseados.

Em 2009 o analista financeiro Louis Redshaw do Banco Barclays declarou que o mercado de Créditos de Carbono poderia se tornar o maior mercado de commodities do futuro.

Afinal, se puderem injetar liquidez nos mercados internacionais emitindo títulos sobre todo o conjunto de recursos naturais e matérias-primas, isso significaria garantir à esfera financeira uma quantidade de negócios quase inesgotáveis. Quase.

Os bancos sabem disso. Inclusive, num portfólio de 2009 do Itaú, são apresentadas ações para clientes interessados em diversificar sua cartela de investimentos com os títulos de créditos de carbono, no qual é apresentado um gráfico do Barclays, onde a taxa de retorno média dos últimos dois anos foi de 37%.

Retornos modestos, mas que para um mercado que precisa reciclar papéis sujos emitidos que continuam circulando desde as crises das empresas "ponto.com" (2001) e das hipotecas subprimes norte-americanas (2008), o dinheiro ambiental é uma ótima fonte de negócios novos.

Mas e resultados práticos disso?...

O primeiro período do Protocolo de Quioto, aquele que institui o mercado de emissões de Carbono como forma viável de desenvolvimento sustentável e mitigação dos desastres ambientais referentes ao aquecimento global, apenas reduziu em 0,02% as emissões necessárias, um número bem próximo ao fracasso. No entanto, é apresentado como única esperança para as futuras gerações  [fala-se de resultados ecológicos, mas na verdade o que lhes interessa são oportunidades] de investimentos.

Os créditos de carbono já são conhecidos pelos mais íntimos como carbono subprime. Esses créditos precisam ser validados para só então serem emitidos e posteriormente comercializadas no mercado. Mas os investimentos fazem negócios visando o futuro, e não podem esperar tamanha burocracia, já que mercados que ainda enfrentam as dificuldades herdadas pela última crise estão em busca de liquidez.

O que sabemos é que esses títulos que ainda sequer foram produzidos já circulam nos mercados. Colocando os países emissores destes créditos, por exemplo, o Brasil, no centro de futuras bolhas financeiras que possam vir a se formar.

O discurso ambiental do qual a candidata Marina Silva é defensora conforme vemos em seu programa é o da geração de um ambiente sustentável [para a economia], que vive em crises sucessivas e necessita constantemente de injeções de liquidez para seus mercados secundários. Os mesmos que encenaram as crises recentes do sistema financeiro. Não é à toa que uma série de bancos estão interessados na candidata da Coligação, e em pouco tempo muitos outros estarão. É o desenvolvimento sustentável para a economia financeira garantir novas plataformas de valorização.
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